Após
a cerimônia de iniciação, o Venerável Mestre entrega o Avental ao Mestre de
Cerimônias, para com ele revestir o neófito. O agora Maçom, só poderá entrar no
Templo de sua Loja, ou de qualquer outra, vestindo o Avental. Tal insígnia
maçônica, nas palavras do Irmão Assis Carvalho, “é o principal Símbolo que
compõe a Indumentária Maçônica.” O Avental, para o citado autor, possui uma
característica especial que o diferencia de outras insígnias: está presente
desde os remotos tempos Operativos.
Para
compreendermos melhor sua função e o porquê de suas diferentes formas,
utilizaremo-nos de uma análise histórica do Avental. Contudo, ressalte-se,
concentraremos nossos esforços em uma análise histórica e funcional, tendo em
vista o Grau de Aprendiz, já que sabidamente, muitos dos símbolos que são
ostentados em Aventais de Graus mais elevados ainda fogem e devem mesmo fugir
de nossa compreensão de Aprendiz. Para alguns escritores, a origem do Avental
está ligada a tempos muito remotos, como o Paraíso Terrestre. Alguns irmãos
vêem Adão como o inventor do Avental, representado na folha de parreira, a qual
cobria seus órgãos genitais. Quanto a esta origem, as objeções são muito
grandes, tendo em vista que a base cientifica ou mesmo filosófica para tal tipo
de análise se mostra praticamente inexistente. Se é verdade que a Maçonaria não
pretende ser apenas uma sociedade cientifica e filosófica, é fato que toma como
base dados científicos para justificar muita de suas concepções. Ao fazer uma
análise de tal porte, deveria-se esperar uma explanação um pouco mais
exaustiva, tendo em vista a originalidade da idéia. Contudo, pelas bases às
quais tivemos acesso, tal assertiva se mostra não muito consistente. O Irmão Assis Carvalho, inclusive, demonstra
uma certa ironia ao comentar tal fato, classificando como “uma fantasia, um afã
criativo” enfim, conotando que a origem do Avental não está, em hipótese
alguma, ligada à figura religiosa de Adão.
Outros
também vêem uma origem mais que milenar para o surgimento do Avental, tendo
como base os Mistérios Egípcios, Persas, Indus, entre outros. Nesse ponto,
descreveremos uma das possíveis formas de tal Avental egípcio: era triangular,
com a cúspide para cima e com vários adornos diversos dos hoje existentes. Além
disso, a faixa ao redor do corpo que o sustentava não tinha apenas este
propósito, mas estava intensamente magnetizada com o corpo. Há também, acerca
deste possível Avental, descrições mais pormenorizadas sobre o Avental dos
Mestres, o que, como já se afirmou, não se mostra pertinente com a proposta
deste trabalho. Contudo, vale ressaltar que se faziam presentes as rosetas e
uma cor azul pálida, simbolizando a inocência branca sendo substituída pelo
conhecimento, o céu azul. Uma outra corrente associa o surgimento do Avental às
Guildas e corporações Medievais. Tais associações, que deram origem à Maçonaria
Operária, tinham por hábito distribuir entre seus Membros, aventais para o
exercício do ofício ao qual estavam ligados. Esses aventais, portanto,
apresentavam entre si leves diferenças com base nos diferentes trabalhos e
conhecimento acerca do ofício em questão, tais como Sapateiro, Ferreiro
Açougueiro, entre outros. O Avental dos antigos operários da Maçonaria
Operativa estava ligado à idéia de trabalho, era um instrumento do próprio. O
Avental era feito com a predominância do couro de carneiro, um couro espesso,
com vistas a proteger os obreiros de labutas muitas vezes perigosas para o
corpo humano. Enfim, o Avental era uma proteção para o corpo dos maçons
primitivos, cobrindo, em linhas gerais, desde o pescoço até o abdômen, sendo
que o do aprendiz cobria uma parte maior do corpo do que o avental do
Companheiro e do Mestre, pois como o aprendiz não possuía, ainda, a habilidade
necessária com as ferramentas, além de iniciar o trabalho na Pedra Bruta,
estava sujeito a fazer um uso maior do avental do que os mestres. Uso maior não
em tempo, e sim, stricto sensu, de
aproveitar o avental conforme sua destinação de proteger o corpo e a roupa de
quem o usa. Com a transição da Maçonaria Primitiva para a Maçonaria
Especulativa, processo histórico que não ocorreu de forma instantânea, a figura
e a função do Avental foram paulatinamente se alterando. Ressaltamos mais uma
vez que, por um considerável tempo, tanto a Especulativa quanto a Operativa
conviveram, especialmente pelos relatos que se tem da Inglaterra no século
XVIII.
Como
exteriorização dessa relativa dicotomia entre Especulativa e Operativa, temos
na Inglaterra a existência de duas grandes potências justamente nesse século de
transição. Note-se que não se trata de uma correspondência absoluta entre ambas
as dicotomias, embora ambas guardem uma não desprezível ligação. De um lado
havia as Grandes Lojas dos Antigos, formadas principalmente por Maçons mais
tradicionais, mais “conservadores”, nas quais não ocorreram grandes mudanças em
relação ao Avental, predominando, exceto pelo couro de ovelha que passou a ser
o material mais utilizado, uma relativa padronização e simplicidade nos
Aventais de todos os Graus, tendo em vista que os próprios eram adquiridos, em
sua maioria, pelas próprias Lojas e concedidos aos Irmãos. Do outro, as Grandes
Lojas dos Modernos, de natureza teoricamente mais democrática, mais aberta, as
mudanças mais significativas ocorreram em relação ao Avental. A concepção do
simbolismo do Avental decorre justamente do entendimento que a Maçonaria
Especulativa passou a conceder ao Avental. O Avental passou a ser visto como um
emblema da dignidade, da honra, do trabalho material ou intelectual, trabalho
esse que era desprezado. Naturalmente, numa sociedade marcada anteriormente
pelos senhores da terra, apenas a propriedade era vista como algo dignificante.
A Maçonaria Especulativa alçou o Avental como símbolo do trabalho, da labuta,
ao qual o Maçom está ligado ao adentrar na Ordem, dignificando o próprio, o
trabalho, perante os olhos da sociedade. Esse é o grande significado do
Avental, enquanto instrumento fundamental do Maçom. Esta é a grande razão
simbólica pela qual um Aprendiz Maçom não deve adentrar em uma Loja sem estar
coberto por essa indumentária. Tal insígnia não nos deixa esquecermos que a
labuta é uma constante na vida do Maçom, seja em Loja ou fora dela. Contudo, ao
mesmo tempo em que as Grandes Lojas Antigas alçaram o Avental como símbolo, e,
conseqüentemente, modificaram sua forma, passando a utilizar tecidos mais leves
tal como o cetim, o brim e o linho, a vaidade, algumas vezes exagerada de
alguns Irmãos, provocaram uma verdadeira revolução no Avental. Verdadeiras
obras de arte, pinturas, foram realizadas nos Aventais das Grandes Lojas dos
Modernos. Novos símbolos, tal como roseiras, fitas, bordados, foram
introduzidos nos Aventais, especialmente dos Graus de Mestre. Enquanto nas
Grandes Lojas Antigas predominavam a simplicidade destes instrumentos Maçônicos
tão preciosos, principalmente no Grau de Aprendiz, sendo o branco predominante,
até pelo material utilizado, o couro de ovelha, nas Grandes Lojas Modernas
houve uma radical transformação exteriorizada nas pinturas das Abetas, na
criação de laços, pinturas de novos símbolos, entre outros. Quanto maior o
Grau, maiores as “sofisticações” encontradas.
Quanto
a esta sofisticação dos Aventais, e esta nova função de certa forma
“decorativa”, dois comentários se
mostram muito pertinentes. O primeiro, tendo como base assertivas de Assis
Carvalho, tendo como objeto o Cavaleiro Miguel André de Ramsay, codificador do
Rito Escocês. Buscando negar a origem Operativa da Maçonaria, e afirmar uma
origem Nobre, como sucessores dos Templários, de Jacques De Moley, o Irmão
Ramsay impulsionou a criação de Graus e
nomes pomposos na Maçonaria e, conseqüentemente, os mais belos e ricos Aventais
foram sendo também criados. Além disso, cabe agora relembrarmos a definição
introduzida no começo de nosso trabalho, atribuída a Jules Boucher: “o Avental
constitui-se no essencial adorno do Maçom.” Raimundo Rodrigues explica que a
palavra adorno tem o sentido de enfeite, decoração. Conclui ele na imprecisão
de sintaxe no uso de tal palavra, já que a função fundamental ou essencial do
Avental seria simbolizar o trabalho ao qual os Maçons devem se entregar.
Contudo, fazendo uma outra análise, podemos compreender a utilização de tal
vocábulo, visto que, para muitos Irmãos, a utilização do Avental ficou muito
ligada à idéia de enfeitar-se para quando da participação em Loja. Aliás,
conforme relata Assis de Carvalho, eram comuns os Maçons das Grandes Lojas
Modernas saírem das sessões e caminharem por Londres devidamente trajados,
felizes na utilização de seus Aventais, enquanto os Maçons das Grandes Lojas
Antigas, por estarem acostumados a utilizar o Avental quando em oficio, visto que
muitos ainda eram Operários, utilizarem apenas os simples Aventais quando em
Loja ou justamente no local de labuta.
Em
1813, com a unificação das duas grandes Potências Inglesas, houve também a
edição de um normativo regulamentando e padronizando os Aventais, de forma a
coibir os inúmeros abusos. Logicamente, alguns símbolos introduzidos ao longo
do tempo foram consolidados, mas os exageros cessaram, e, até hoje, pelo que
afirma Assis Carvalho, não houve grandes mudanças nos Aventais Ingleses,
caracterizados pelo rito York. Vale ressaltar também o Congresso Mundial dos
Supremos Conselhos em Lausane, datado de 1875. Nesse encontro, decidiu-se
também por uma padronização dos Aventais utilizados pelos seguidores do Rito
Escocês Antigo e Aceito. Nesse ponto, o autor Assis de Carvalho faz uma critica
expressa aos seguidores de tal rito no Brasil, tendo em vista as seguidas
mudanças do Avental aqui ocorridas nas últimas décadas, levando em conta que o
R.’.E.’.A.’.A.’. não assistiu a grandes
mudanças em outros países. Como último ponto a se destacar do Avental Maçônico,
gostaríamos de nos focar na Abeta. Muitos estudiosos Maçons procuram dar
significados à sua posição em relação ao Avental. Outros, entretanto,
apooiando-se na experiência histórica e mesmo em fotografias antigas, têm
demosntrado que a Abeta não tem um sentido simbólico, pelo menos em sua origem.
Antony Sayer, primeiro Grão Mestre da Loja da Inglaterra (1717), está
caracterizado em fotos com uma Abeta levantada. Ressalte-se que ele era Mestre
e que sua Abeta estava levantada. A utilização da Abeta para baixo ou para cima
está, segundo esses autores, mais ligada, originalmente, à praticidade do que a
qualquer simbolismo. A Abeta era utilizada pelos Irmãos Operativos para prender
o Avental à camisa, tendo propositalmente um espaço próprio para este botão.
Alguns irmãos baixavam a Abeta como forma de esconder imprecisões, desgastes da
alguns Aventais. Alem disso, a forma triangular ou oval não apresentava também
qualquer significado. Atualmente, se admite a diferença no posicionamento para
se caracterizar o Grau, o que pode ser considerado muito válido. Contudo,
originalmente, pela análise histórica da Abeta, há autores que defendem a
inexistência de um simbolismo próprio. Além disso, como já se afirmou anteriormente,
as correias que prendiam as Abetas ao corpo dos Maçons Operativos, tanto no
pescoço como na cintura, nada tinham de especial. Eram apenas correias, sem
nenhum magnetismo ou coisa do tipo.
Finalizando,
o Avental simboliza, em uma primeira impressão, ainda no cerimonial de
Iniciação, trabalho, labor, labuta. O que podemos aprender com significado de
trabalho do Avental? Que todo Maçom deve dedicar- se ao trabalho diariamente,
e, quando ele está em Loja, ou, mais propriamente ao tema, quando ele está na
Oficina, o trabalho é simbolizado pelo
uso do Avental. Mesmo havendo posicionamentos diferentes com relação ao
simbolismo do avental ou ao seu uso prático, não há como deixar de mencionar-se
a interpretação mais aceita e oportuna com relação a essa indumentária. Ao
desbastar a Pedra Bruta com o maço e o cinzel, o avental protege o Aprendiz
contra a poeira e os estilhaçoes provenientes de seu ofício. Cumpre o papel que
sempre cumpriu, a saber, o de servir como uma peça extra de proteção no manuseio,
por exemplo, da pedra e até mesmo como um meio de transporte de pedras (e
outros materiais) de um lugar para outro. O avental, dessa forma, está
protegendo o Irmão das consequências do seu trabalho de aprimoramento constante
e da eliminação de seus defeitos. Graças à proteção do avental, a roupa do
Irmão, como se fosse sua reputação, está a salvo da sujeira representada pela
poeira e os resquícios dos defeitos inerentes a todos nós, seres humanos.
Cumpre, sobretudo, o Avental, o seu papel de um dos mais importantes Símbolos
da Maçonaria e de elo entre aqueles que o portam, como Irmãos Maçons, unidos,
através dessa indumetária, pela fraternal amizade.
Bibliografia
Ritual
do R∴E∴A∴A∴
CARVALHO,
Assis. O Avental Maçônico e outros Estudos, 2a ed., Londrina: Ed. Maçonica “A
Trolha”, 1997;
CARVALHO,
Assis. Ritos & Rituais, 1a ed., Londrina: Ed. Maçonica “A Trolha”, 2001;
CASTELHANI,
José. Manias e Crendices em Nome da Maçonaria, 1a ed., Londrina: Ed. Maçonica
“A Trolha”, 2002;
RODRIGUES,
Raimundo. Visão Filosófica da Arte Real, 1a ed., Londrina: Ed. Maçonica “A
Trolha”, 2002;
Ir∴Roberto Varo Junior
Ir∴Henrique dos Santos Aires
Ir∴Rafael Beccari de Sena
Ir∴Felipe Silva Martinez
Ir∴Ramom Dantas Rotta
A∴R∴L∴S∴“FRATERNIDADE ACADÊMICA UNIVERSITÁRIA
BERNARDINO DE CAMPOS” – nº 3392
Fonte: Revista Universo Maçônico
Fonte: Revista Universo Maçônico
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