Por
João Anatalino
A
Corda de 81 Nós é um dos símbolos mais controversos da iconografia maçônica.
Como símbolo ela se presta a diversas interpretações e sua origem e real
significado tem sido objeto de múltiplas especulações. Isso ocorre porque todo
símbolo carrega em si um elemento de Gestalt. Cada observador acrescenta ao seu
significado as suas próprias intuições a respeito. [1]
Nos
templos maçônicos, a Corda de 81 nós é encontrada no alto das paredes, junto ao
teto e acima das colunas zodiacais, como ornamento obrigatório, parecendo
indicar que ali é posta para delimitar um determinado território, o qual deve
ser preservado de interferências externas.
Sua
origem histórica parece vir dos antigos canteiros de obra medievais, onde os
chamados maçons ─ literalmente, trabalhadores de maço e cinzel ─ ou seja,
artesãos que trabalhavam no esquadrejamento das pedras que iriam compor os edifícios,
costumavam demarcar o seu local de trabalho. Nesses espaços, normalmente
conhecidos como Lojas, esses trabalhadores de cantaria costumavam se
reunir para transmitir instruções, receber seus salários, conversar sobre
assuntos de seu interesse, etc. Essa, aliás, é uma das possíveis origens
históricas do termo Loja, aplicável à reunião dos trabalhadores da construção
civil, e da qual derivou a tradição maçônica. Como a profissão do maçom era
regida por rígidas regras corporativas, que faziam dela uma corporação
praticamente iniciática, essa medida, a de delimitar o espaço maçônico dentro
do canteiro de obras, era perfeitamente justificável. A corda com nós também
era usada para efetuar medições de distância para demarcação dos espaços dentro
do edifício.[2]
Já
a razão de ela ter 81 nós parece que deriva do apego à tradição medieval ao
chamado modelo três por quatro. Praticamente, todos os espaços geométricos dos
edifícios antigos eram desenhados a partir de uma projeção retangular que
partia dessa medida e se multiplicava por esse módulo conforme o tamanho que se
pretendesse para o vão livre que se queria dar ao espaço. Eram as chamadas
“caixas”, a partir das quais o edifício era metrificado e construído. [3]
Evidentemente
essa não era uma fórmula obrigatória nem se constituía regra geral para uma
construção, mas apenas uma tradição observada pelos construtores medievais.
Era, segundo se dizia, uma tradição derivada das técnicas de construção
utilizadas pelos arquitetos da Grécia clássica, onde o mais belo de todos
os edifícios jamais construídos, o Partenon, teria sido erguido a partir desse
módulo.
Mais
variadas, porém, são as interpretações esotéricas que são dadas a esse símbolo,
as quais são oriundas de intuições místicas inspiradas em temas gnósticos e
cabalísticos, onde entram também o pitagorismo e a teosofia, correntes de
pensamento que, como bem viu Jung em sua análise da base psíquica do pensamento
humano, são informadas por um arsenal simbólico (arquétipos) que habita no
Inconsciente Coletivo da espécie humana desde suas origens.
O
número 81 é um número cabalístico por excelência. Ele é o resultado do
número 3 elevado á sua quarta potência. Esse número sugere um universo formado
por uma base tripla, que parte da noção de que na origem de tudo existe uma
trindade de deuses: (Pai, Filho, Espírito Santo, Brhama Vixenu e Xiva,
Osíris, Isis, Hórus etc), dando origem às realidades universais. Da
mesma forma, são três os formadores da raça humana (os filhos de Noé) Sem, Cam
e Jafet), assim como são três as ferramentas com as quais o Criador constrói o
universo: a luz, o som e o número e três as manifestações da Divindade antes de
dar a si mesmo uma condição de Existência Positiva: Aun, Aun Soph e Aun Soph
AUR[4]
Essas
três manifestações se derramam pelos quatros mundos da formação primordial, que
são conhecidos como os mundos de Atziloth, Briah, Yetzirah e Assiah [5]
Assim,
o modelo três por quatro é um arquétipo bastante presente na intuição dos
profissionais da construção civil e a ele foi integrada a tradição cabalística
que se associa a esse número. Na tradição cabalística, a trindade se revela nas
três primeiras séfiroths da Árvore da Vida ( Kether, Chokmah e Binah), que são
as primeiras manifestações da divindade no mundo da realidade positiva. Elas
se expressam através da luz, do som e do número, que segundo essa
tradição, são os elementos com quais Deus faz o mundo. Destarte, como o
universo é construído através das combinações do Nome Inefável
(o Tetragramaton) formado pelas letras IHVH (IAVÉ), que resulta no número
12, temos uma base trina multiplicada por quatro, como formulação básica da
estrutura do universo. Por isso temos toda a mística do povo de Israel em torno
desse número. As doze tribos de Israel, os doze signos do Zodíaco, os doze
apóstolos de Cristo, os doze profetas do Velho Testamento (seis maiores e seis
menores) os doze livros da constituição doreino de Israel, que são o Pentateuco
(5), Josué (1), Juízes (1), Samuel (2) Reis (2) e assim por diante. .
Na
física atômica pode ser feita uma analogia com as leis fundamentais de formação
da matéria universal que são a relatividade, a gravidade e a termodinâmica.
Essa base tríplice, que geometricamente se firma sobre um triângulo equilátero,
resulta num universo tridimensional (altura, profundidade, largura). Por
outro lado, como o universo é constituído por quatro elementos fundamentais
(terra, ar, fogo, água), projetado em quatro direções (norte, sul, leste,
oeste), isso significa que a sua conformação pode ser representada pelo número
três na sua quarta potência, que resulta no número 81, número sagrado, que na
tradição cabalística é representado pelos 72 anjos que servem diante do trono
de Deus (os semanphores), mais os 9 Elohins, mestres construtores do
universo[6]
Esses
anjos são portadores dos archotes, ou seja, portam a luz que dá existência ao
universo em suas duas estruturas (a material e a espiritual), razão pela qual a
planta do universo cabalístico serve de inspiração para a conformação
geométrica da Loja Maçônica.[7]
Dessa
forma, a corda de 81 nós representaria uma delimitação territorial da estrutura
da Loja Celeste, que é todo o cosmo, razão pela qual, nas antigas Lojas
especulativas era costume marcar no solo, com giz ou outro instrumento de
traçado, os símbolos da Ordem, circundados por uma borda semelhante a uma corda
cheia de nós. Nessa simbologia se dizia que ali se construía obra
semelhante áquela realizada pelo Criador.[8]
Segundo
o ritual do Grau 20 do Supremo Conselho do Grau 33 do Paraná, 81 anos era a idade
de Hiram Abiff quando foi assassinado. 81 era também o número de meses que um
irmão precisava para chegar ao ápice da Escada de Jacó no antigo ritual dos
maçons do Real Segredo, na França e na Alemanha.[9]
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Em
termos filosóficos, a corda de 81 nós significa a “amarração” universal feita
pelos Irmãos em torno do universo representado pela humanidade. Os nós são os
irmãos (representação simbólica dos 72 arcanjos e os nove Elhoins) com as mãos
dadas, formando o quadrilátero sagrado, onde a abertura aponta que qualquer
pessoa de bons costumes pode adentrar nesse quadrilátero e participar dessa
união em prol da evolução e da felicidade da raça humana.
Assim,
o simbolismo da Corda de Oitenta e um Nós vai muito além de uma mera
ornamentação no teto do templo maçônico. Cada um pode pensar e interpretaro que
quiser acerca desse símbolo. Por isso o associamos á uma Gestalt. Não importa o
que ele de fato significa como imagem ou mesmo como signo no campo da semiótica
e da semiologia, nem mesmo o seu significado em termos de filosofia.
Importa sim o que ele fala ao espírito do Irmão. Pois a Maçonaria, como toda
disciplina iniciática, só tem sentido como atividade espiritual. O resultado
dela no mundo profano é mero reflexo dessa atividade. Será útil ou inútil,
virtuoso ou nocivo conforme os Irmãos entenderem a mensagem que os símbolos da
Ordem lhe comunicam.
[1]Gestalt
é a doutrina que ensina que a soma das propriedades de um objeto formado em
nossa mente é mais do que ele realmente é, pois a mente acrescenta ao objeto
outras propriedades que ela “acha” que o objeto tem. Exemplo disso é uma nuvem
no céu, que olhada por diferentes pessoas pode assumir formas totalmente
diversas na mente de cada observador.
[2] Jean
Palou- A Maçonaria Simbólica e Iniciática, Ed Pensamento, 1978
[3] Fulcanelli-
As Moradas Filosofais- Madras, 2012
[4][4] Na
Cabala, Deus, antes de fazer o universo é considerado como uma energia em
estado latente (com Existência Negativa). Na sua tarefa de fazer o universo ele
se manifestou como Existência Positiva.
[5] De
acordo com os ensinamentos da Cabala, a atividade divina na construção do
universo se manifesta em quatro mundos formativos que são: o mundo da luz
(Atziloth), o mundo do espírito (Briah), o mundo do energia (Yetzirah) e o
mundo da matéria (Assiah).,
[6] Knorr
Von Rosenroth- A Kabbalah Revelada- Madras, 2010. Tabela que mostra a relação
entre a Árvore da Vida, os quatro mundos de formação, as combinações entre as
letras do Nome Sagrado e as diferentes conformações assumidas pela energia
divina no trabalho de construção do universo.
[7] Vide
o nosso ensaio, publicado neste Recanto das Letras, “ O Templo e a Árvore
”, no qual mostramos a relação simbólica existente entre os desenhos da Árvore
da Vida da Cabala, e o desenho do Templo maçônico.
[8]Idem,
Jean Palou –Maçonaria Simbólica e Iniciática, citado. Pois segundo a ótica dos
maçons medievais, as igrejas que eles construíam eram cópias simbólicas do
universo, na forma como Deus o construía.
[9] Artigo
II da Constituição dos Princípios do Real Segredo para os Orientes de Paris e
Berlim, edição de 1762
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2 Comentários
Nobre Irmão,
ResponderExcluirGostaria de entender como se chega ao valor "12" com o IHVH (IAVE) ??? *Seria acrônimo ???
Usando a lingua hebraica chega-se a 26 = י ה ו ה (Yod:10, Hei:5, Vav:6, Hei:5).
Parabéns pelo excelente texto !!!
Gratidão pela confirmação no ⌛🎯 shalon um T.:.F.:.A.:
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