Por
Ir.’.José Maurício Guimarães (*)
É
de Hans Christian Andersen a história que se passou, certa vez, na corte de
Thunder-Ten-Tronckh onde lecionava o ilustre Professor Dr. Pangloss. O
dinamarquês Hans Christian Andersen viveu de 1805 a 1875; o ilustre Dr.
Pangloss é mais antigo, viveu nos tempos do "déspota esclarecido"(1),
assim chamado Frederico II, conhecido como Frederico, o Grande, de 1712 a
1786.
Vamos
aos fatos:
Tronckh
(vamos chamá-lo assim, resumidamente, para facilitar a escrita e a leitura
em voz alta) era cercado por puxa-sacos extremamente vaidosos pois, como é bem
sabido, o segredo dos demagogos é se fazerem passar por tão bem
intencionados quanto seus súditos, para que estes se imaginem tão espertos
quanto ele.
Pois
bem; o Rei Tronckh se preocupava em vestir roupas caras, adornadas e elegantes,
para impressionar ainda mais a corte dos preguiçosos que o acompanhava submissa, no
intuito conseguirem títulos de nobreza.
Certo
dia, chegaram à capital dois viajantes que, sabendo da vaidade do Rei
Tronckh, espalharam a notícia de que eram mestres tecelões possuidores de um
tecido especial, de cor e padrão únicos no mundo.
Logo
que o Rei Tronckh soube da noticia, animou-se com a ideia de possuir um traje
magnífico costurado pelos excelsos mestres tecelões. Mandou chamar
Fürdqulanr e Lanndeslanlsdesn (estes eram os nomes dos mestres tecelões ˗ não
vos assusteis) e adiantou-lhes uma boa soma de dinheiro para que começassem
a teceruma veste com o tal tecido de cor especial e padrão único. Mandou
hospedar Fürdqulanr e Lanndeslanlsdesn numa sala contígua à da
tesouraria, provendo-os de um tear apple, fios de seda em ouro microsoft,
conforme exigido, e agulhas netscape. Ordenou que os cozinheiros
Yürtdes e Yüromrklanlo (não vos assusteis; estes eram os nomes dos
cozinheiros reais) servissem aos ilustres alfaiates a melhor comida e a melhor
bebida existente nos feudos reais.
Uma
semana depois, os mestres tecelões estavam diante do tear, tecendo
sem parar, e assim permaneceram por muitos dias, pedindo cada vez mais ouro,
mais dinheiro, melhores comidas e os mais sofisticados vinhos do exterior.
Rei
Tronckh estava curioso, ainda mais pelo fato de seus espiões terem comunicado
que Fürdqulanr e Lanndeslanlsdesn pareciam fingir que costuravam...; moviam as
mãos, mas era impossível ver o tecido ou a roupa que costuravam. Tronckh
resolveu enviar o primeiro-ministro para inspecionar a obra.
Quando
o ministro entrou no ateliê dos artífices, não conseguiu ver absolutamente nada
˗ apenas que eles moviam as mãos concentradíssimos. Ficou na dúvida e
preocupado. Seriam falsos tecelões? Como se sabe, todo primeiro ministro é
dotado de poucas luzes, quadrado e sacolejante como um jeep. Então,
consultou o vice-ministro se ele conseguia ver o padrão do tecido; mas o
vice-ministro respondeu gaguejando, com medo de perder o cargo:
˗
é... é... é..., mas claro! Nunca vi coisa igual!
A
mesma resposta foi dada pelo vice-vice-ministro, e igualmente pelo
vice-vice-vice-ministro, pelo vice-vice-vice-vice-ministro e pelo
vice-vice-vice-vice-vice-ministro e seus assessores diretos e indiretos:
˗
Claro! Nunca vimos tamanha beleza na vida!
O
primeiro-ministro levou ao conhecimento do Rei Tronckh o parecer sobre os
progressos da confecção e elogiou o bom gosto dos profissionais:
˗
Nunca vi tamanha maravilha, majestade!
E
o rumor se espalhou pela cidade e pelo reino: a nova roupa do Rei Tronckh,
oitava maravilha do mundo!
Depois
de duas semanas, o Rei Tronckh, ansioso, resolveu ele mesmo visitar os
tecelões. Quando entrou no ateliê de costura, não viu nada além de um tear
vazio e os mestres Fürdqulanr e Lanndeslanlsdesn agitando as mãos como se
costurassem no espaço um tecido invisível.
Meio
confuso, o rei não disse nada e voltou à sala do trono, dando prosseguimento as
despachos de ofício.
Três
semanas depois, os tecelões se apresentaram diante do rei, trazendo a roupa
para que ele experimentasse.
O
Rei Tronckh postou-se diante de um grande espelho, tirou as roupas que
vestia enquanto os tecelões fingiram lhe entregar a túnica, depois a calça e a
capa com sua longa cauda (os monarcas geralmente adoram longas caudas; não sei
porquê).
O
resto da corte observava de boca aberta.
˗
Mas esse troço não é um pouco leve demais? ˗ indagou o rei meio sem graça.
˗
Majestade, disse Lanndeslanlsdesn ˗ a leveza deste tecido é uma de suas
qualidades mais apreciadas.
˗
Majestade, disse Fürdqulanr curvando-se até o chão ˗ podeis estar
confuso, mas garantimos que, além de muito leve, esta roupa tem um quê de
invisível para pessoas tolas ou incompetentes. Além de bela, como bem
o podeis constatar, tem a virtude extra de desmascarar aqueles que não
merecem cargos importantes e de confiança na corte. Possui poderes mágicos
para denunciar ministros ou secretáriostolos e incompetentes.
Os cortesãos
e cortesãs, que observavam a cena de boca aberta, começaram a ficar
preocupados. E quase de uma só voz, exclamaram:
˗
Nunca vimos tamanha maravilha, majestade! Nunca vimos tamanha maravilha,
majestade! Nunca vimos tamanha maravilha, majestade! rüfnalsedsedy!rüfnalsedsedy! rüfnalsedsedy!
(expressão que significa "louvado seja o rei", na língua
thunder-ten-tronckh).
Porém,
depois daquela tarde, os impostores e aproveitadores não dormiram tranquilos,
pois aguardavam com terror o momento em que o rei vestisse a tão famosa roupa
para entrevistá-los.
Nem
rivotril conseguia fazê-los dormir. Andavam como baratas-tontas de
um lado para outro, sem comer, com os olhos fundos e vidrados, murmurando
coisas desconexas:
˗ rüffy.......... nals......... edsed........ ylaynd....... eslanls...... desnfürd.....qulanrthu.... ndertentronckh...
No
dia e hora combinados, os alfaiates fizeram os últimos ajustes e foram
ajudar a paramentar o rei para o desfile na parada militar.
˗
É realmente uma beleza! Um trabalho e tanto... ˗ concordou Rei Tronckh, enfim...,
meio sem graça.
Nenhum
membro da corte ousou confessar que não estava enxergando nada, pois ninguém
queria ser considerado idiota ou indigno do cargo que ocupava. Enquanto isso,
os espertos tecelões sorriam satisfeitos, barrigas estufadas e uma conta
bancária bilionária, numerada, num dos bancos da Suíça (como bem o sabeis, a
Suíça é especialista na fabricação de relógios, chocolates e novos ricos).
Dito
isso, o rei desceu as escadarias do palácio, escoltado por uma guarda juvenil e
sob uma chuva de flores silvestres atiradas pelas virgens (não vos
assusteis,já havia virgens naquela época), e entrou triunfante no pátio
onde já estavam os soldados em trajes de gala.
˗
rüfnalsedsedy! rüfnalsedsedy! rüfnalsedsedy!
(cuja tradução já conheceis).
Dali,
seguiram até à praça dos desfiles acompanhados pelo estridente som daRoyal
Banda Philarmônica do Estado Thunder (hoje extinta por falta de
verba).
O
cortejo prosseguiu. Mas ninguém conseguia ver a tão festejada roupa do rei.
Contudo, evitavam dizer qualquer coisa (pelos motivos já expostos que
já conheceis) ˗ apenas abafavam, a muito custo, o riso.
De
repente, um menino ˗ de uns sete anos ou menos ˗ gritou apontando:
˗
O rei está nu! quááááááááá! Onde está a roupa nova?
Silêncio
na praça.
Silêncio
logo quebrado pelo sapateiro:
˗
O garoto está dizendo que o rei está sem roupa!
Em
seguida pelo açougueiro:
˗
É a voz da inocência! O rei está peladão, quááááááááá!
Em
seguida os carvoeiros:
˗ quááááááááá! É
a voz da pureza! O rei está pelado mesmo!!!
˗
Criança não mente, diz o que vê, ˗ comentaram as mulheres (e as
mulheres têm sempre razão, como bem o sabeis!).
E
todo o povo desabou numa só gargalhada: quááá! quáááá! quááááá!
quáááááá kkkkkkkkkkkk!
Riram
às bandeiras despregadas, rolaram no chão de tanto rir:
˗
O rei está nu! o rei está nu! o rei está nu! o rei está nu! (em na língua de
thunder-ten-tronckh: nulanstfürylansedo!)
E
o rei fugiu em disparada para o castelo, com uma das mãos tampando a frente e a
outra tampando atrás.
MORAL DA HISTÓRIA
SEGUNDO OS PENSADORES
"Antes
que você seja diagnosticado com depressão, procure certificar-se de que não
esteja cercado por idiotas" (autor desconhecido, atribuída a
Freud);
"Para
ter sucesso neste mundo não basta ser estúpido, é preciso também ter boas
maneiras" (Voltaire);
"Há
apenas duas formas de subir na vida: pela engenhosidade e mérito, ou pela
estupidez dos outros" (Jean de la Bruyere);
"Rir
de tudo é coisa dos tontos; mas não rir de nada é coisa dosestúpidos"
(Erasmo de Roterdam);
"Não
se aproxime de uma cabra pela frente; nem de um cavalo por trás; nem de um
idiota por qualquer dos lados" (provérbio judaico);
"O problema
do mundo é que os estúpidos são excessivamente confiantes, e os
inteligentes são cheios de dúvidas" (Bertrand Russell);
"A
estupidez senta-se na primeira fila para ser vista; a inteligência senta-se na
última fila para contemplar a imbecilidade humana" (de novo o Bertrand
Russell);
"Só
os extremamente sábios e os extremamente estúpidos é que não mudam"
(já dizia o chinês Confúcio);
"Vamos
agradecer aos idiotas. Não fosse por eles não faríamos tanto sucesso"
(Mark Twain);
"Eu
só invejo a burrice só por um motivo: ela é eterna" (Nelson Rodrigues);
"Toda
unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar"
(de novo o Nelson Rodrigues);
"É
preciso ter dúvidas. Só os estúpidos têm uma confiança absoluta em si mesmos"
(Orson Welles);
Por
fim, "se por um lado os cães ladram e a caravana passa, de outro os
bodes não berram e os reis pelados seguem em frente. Pois tudo passa",
digo eu mesmo (que para o terror de muitos e minha extrema dor de
cabeça, sou apenas um livre-pensador convencido de que a razão convence por ser
mais afiada que a espada); portanto, não me deem ao mesmo tempo uma caneta e
uma espada.
(1)
- Não vos assusteis: "déspotas esclarecidos" foram aqueles soberanos que
tentaram colocar em prática ideias dos iluministas, dando-se muito mal por
isso, pois tinham apenas o poder sem a contraparte iluminada. Ler sobre o
despotismo, e o temor em O Espírito das Leis (Esprit des lois, 1748,
III) de Montesquieu, versando sobre a antiga tripartição das formas de
governo.O mais célebre dentre os "déspotas esclarecidos" foi
Frederico II, chamado Rei Filósofo que dizia: "a razão convence, mas só
a espada vence". Outros "déspotas esclarecidos" foram: José
II, Catarina II, Felipe V e, dizem, o Marquês de Pombal. Entre nós, tivemos
apenas um déspota esclarecido: o Presidente Marechal Floriano Peixoto que usou
o despotismo como forma de governo e um cérebro que nada tinha de esclarecido.
Se souberdes outros "déspotas esclarecidos", enviai-me a lista.
(*)José
Maurício Guimarães
Venerável
Mestre da "Loja de Pesquisas Quatuor Coronati, Pedro Campos de
Miranda".
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