Policiais britânicos obrigados a declarar vínculos com a Maçonaria: UGLE questiona justiça da medida


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  Da Redação

A Polícia Metropolitana de Londres decidiu implementar uma medida que reacendeu um antigo e sensível debate no Reino Unido: a relação entre a Maçonaria e as forças policiais. A partir de agora, policiais que pertençam à Maçonaria deverão informar formalmente sua filiação aos seus superiores, com o objetivo declarado de preservar a confiança do público na imparcialidade da polícia.

Segundo o jornal The Guardian, a exigência não se limita apenas à Maçonaria. Ela se aplica a qualquer organização que demande de seus membros ajuda e proteção mútua, característica que, segundo a corporação, pode gerar conflitos de interesse ou comprometer a percepção pública de neutralidade.


 Confiança pública acima do sigilo

A decisão foi tomada após uma consulta interna conduzida pela própria Polícia Metropolitana, na qual pelo menos dois terços dos oficiais e funcionários se manifestaram favoráveis à medida. Para muitos, a filiação a organizações com juramentos de lealdade poderia “afetar a percepção pública da imparcialidade policial”.

O comandante Simon Messinger afirmou que o momento exigia uma posição clara.

“Após os resultados conclusivos de nossa consulta, decidimos que havia chegado a hora de abordar preocupações antigas e que a confiança do público e dos funcionários deveria ter prioridade sobre o sigilo de qualquer organização de membros”, declarou.

 Ele enfatizou, no entanto, que a decisão não impede que policiais se filiem à Maçonaria ou a outras entidades similares.

 Reação da Maçonaria: medida ‘injustificada’

A Grande Loja Unida da Inglaterra (UGLE) reagiu de forma crítica à decisão e anunciou que estuda contestá-la judicialmente. Para a organização, a exigência é desproporcional e injustificada.

 “Nossos valores de integridade, amizade, respeito e serviço são primordiais na Maçonaria e nunca foram tão importantes”, afirmou Adrian Marsh, representante da UGLE.

Em comunicado divulgado pela BBC, a instituição declarou estar “muito decepcionada” com a decisão da Polícia Metropolitana, ressaltando que tentou manter um diálogo construtivo e aberto antes da adoção da medida.


 Um debate antigo, agora formalizado

Embora a presença de maçons nas forças policiais britânicas seja um tema delicado há décadas, esta é a primeira vez que a questão resulta em uma ação concreta dessa magnitude. A decisão, atribuída ao Comissário-Chefe Mark Rowley, busca fortalecer a credibilidade da polícia em um momento de crescente escrutínio público e suspeitas de má conduta institucional.

De acordo com o The Guardian, parte da motivação para a nova política está relacionada a investigações passadas que levantaram dúvidas sobre a influência de vínculos pessoais e associativos dentro da corporação.

 O caso Daniel Morgan e a questão da lealdade

Um relatório de investigação interna publicado em 2021, sobre o assassinato do detetive particular Daniel Morgan em 1987, trouxe o tema novamente à tona. O documento não descartou a possibilidade de corrupção policial ter prejudicado a investigação e apontou que um dos detetives envolvidos havia sido mestre de duas lojas maçônicas, enquanto outros dez policiais ligados ao caso também eram maçons.

Apesar disso, o relatório foi cauteloso ao afirmar que não encontrou evidências de uso corrupto de instituições maçônicas para obstruir a investigação ou encobrir o crime. Ainda assim, o caso levantou questionamentos sobre a compatibilidade entre juramentos de lealdade dentro de organizações privadas e as responsabilidades do serviço público.

 Críticas e contrapontos internos

Um ex-policial que posteriormente se tornou administrador da UGLE declarou ao The Guardian que sua filiação maçônica nunca lhe trouxe benefícios profissionais. Ele questionou a coerência da medida:

 “Se obrigarmos os maçons a declarar sua filiação, também pediremos que declarem participação no clube de tênis local? Precisamos ser coerentes”.

Por outro lado, Steve White, ex-chefe da Federação Policial, já havia alertado em 2017 sobre a influência de maçons dentro da corporação, alegando que isso poderia dificultar reformas culturais e favorecer promoções internas. A Maçonaria rejeitou tais acusações, reiterando que seus princípios são compatíveis com o serviço público e elevados padrões morais.


 Entre transparência e liberdade associativa

A decisão da Polícia Metropolitana expõe um dilema complexo: como equilibrar a necessidade de transparência institucional com o direito à liberdade de associação. Enquanto a corporação defende que a medida reforça a confiança pública, a Maçonaria vê nela um precedente preocupante, que pode estigmatizar seus membros sem provas concretas de irregularidade.

O desfecho desse embate poderá estabelecer um marco importante sobre os limites entre vida associativa privada e deveres do serviço público no Reino Unido.



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