A
formação de um regime autoritário na Itália em 1922 (sendo uma ditadura
totalitária a partir de 1925) levou a uma luta contra a maçonaria.
No
início, várias associações maçônicas apoiaram a chegada de Mussolini ao poder e
havia muitos maçons entre os fascistas. Porém, paralelamente existia uma forte
corrente anti-maçônica herdada do nacionalismo, compartilhada pelo próprio
Chefe dos “camisas pretas” e por várias lideranças do novo regime.
Inicialmente, a maçonaria foi proibida nas fileiras do Partido, para depois ser
proscrita (em 1925).
Neste
artigo vamos discutir os motivos que provocaram o confronto e o significado da
oposição maçonaria/fascismo, a aliança do fascismo com forças liberais, com a
Igreja católica e a formação de uma “religião política”, incompatível com a
tradição e os valores maçônicos.
A
Maçonaria, cujos ideais coincidem com o liberalismo, participava da vida
política italiana com maçons em todos os partidos (Cordova, 1990). O rejeição
explícita da Maçonaria, além da hostilidade tradicional da Igreja Católica
contava com a Associação Nacionalista Italiana e o Partido Socialista Italiano
(Braschi, 1984).
Em
seu primeiro congresso em 1911 os nacionalistas tentaram declarar a
incompatibilidade entre filiação maçônica e filiação partidária. Em 1913, o
órgão L’Idea Nazionale nacionalista promove uma pesquisa da Maçonaria, cujos
resultados só serão publicados em 1925 quando servirão de base para um projeto
de lei para a abolição das sociedades secretas. Alfredo Rocco, um dos mais
importantes intelectuais e políticos da ANI e futuro Ministro da Justiça do
regime fascista resume a posição Nacionalista: a Maçonaria entrou como um verme
destrutivo na sociedade italiana e todos os dias impede a formação de uma
sociedade italiana unida e da formação de um consciência nacional forte, assim
era a sua opinião. Em primeiro lugar, o anticlericalismo da Maçonaria degenerou
em uma luta anti-religiosa, anti-católica. Quase ao mesmo tempo, os socialistas
italianos começaram as hostilidades contra a maçonaria, liderados pela estrela
em ascensão da socialismo, o jovem Benito Mussolini. Eles diziam que a
Maçonaria era contrária aos interesses do socialismo porque pregava concórdia e
não a luta de classes, e porque era uma expressão da burguesia. No Congresso do
Partido Socialista em julho de 1912, foi apresentada, mas não aprovada uma
moção antimasonica por Nino Mazzoni.
Dois
anos depois do congresso socialista (Abril de 1914) foi apresentada e aprovda a
proposta anti-maçônica de Zibordi Giovanni com um complemento de Mussolini
convidando todas as secções do partido a expulsar os maçons conhecidos. O
motivo de sua atitude foi, além do repúdio a “burgueses”, desencanto com o
Iluminismo humanista e pacifista expresso pela Maçonaria.
Não
esqueçamos que Mussolini era ateu e inimigo de todas as crenças religiosas. Os
maçons estavam preocupados com o colapso do sistema Liberal onde tinham sido
historicamente influente, além disso haviam sinais preocupantes na mobilização
Católica e o ativismo socialista radical inspirado na Revolução Russa.
Torrigiani,
Grão Mestre do Grande Oriente da Itália, proferiu um discurso (em 19 de Outubro
de 1922, uma semana antes da Marcha sobre Roma), alertando os maçons sobre as
dúvidas de apoiar o facismo, servindo para amortecer o entusiasmo pró-fascista
de Irmãos maçons e identificar os limites de um adesão a um fenômeno político
ainda pouco definido (Di Luca, 2007).
Em
novembro de 1922, o IV Congresso da Internacional Reunião Comunista em Moscou
declarou a incompatibilidade entre filiação em partidos comunistas e filiação
na Maçonaria. A hostilidade pessoal e ideológica de Mussolini contra a
maçonaria veio de sua formação marxista e de Nietzsche, persistiu durante e
depois da guerra, no entanto, os interesses políticos prevaleceram. Maçonaria
era uma força que não poderia ser negligenciada, assim mostrou simpatia e
promoveu maçons dentro do movimento facista. Mussolini aceitou sem problemas a
filiação maçônica e até maçons ocupando lugares no Grande Conselho do Fascismo
(o mais alto órgão do Partido Fascista) (Giuriati, 1981). A mudança veio após o
sucesso da Marcha sobre Roma e a formação do primeiro governo fascista, entre o
final de 1922 e início de 1923. Na ocasião Mussolini teve de escolher entre
dois aliados potenciais incompatíveis, a Maçonaria e a Igreja Católica.
Em
um encontro secreto entre Mussolini e o cardeal Gasparri, foi selado acordo
onde a igreja daria apoio a Mussolini em troca receberia a eliminação da
Maçonaria e outros inimigos da Igreja (Savarino, 2007).
Parte
do mundo católico apoiava os fascistas e o Partido Popular de Don Luigi Sturzo
(fundado em 1919), um partido em princípio Católico, mas apoiava velhos e novos
inimigos do catolicismo. Maçonaria, em suma, era uma moeda de troca em um jogo
político onde as forças católicas tinha um peso extraordinário.
As
cartas de Mussolini não foram descobertas até sua ascensão ao poder, então é revelado
os termos do acordo com a Igreja, levando a uma mudança inesperada e
conservadora do movimento pró-católico nascido de um socialista, laico e
anticlerical. Outro fator que influencia essa mudança é a confluência da ANI
com o Partido Fascista, em fevereiro de 1923, com o qual o fascismo recebe uma
grande infusão de cultura nacionalista e homens proeminentes Luigi Federzoni,
Alfredo Rocco e Emilio Borrero, todos pró-católicos e Anti-maçons. Federzoni
escreve em suas memórias que a convergência de ANI com o Partido Fascista “já
não era possível sem remover a Maçonaria” e foram os líderes nacionalistas que
impuserem esta condição. “Também tive que abrir o caminho para o acordo com a
Igreja, porque Mussolini estava disposto a defender a paz religiosa na Itália e
respeitar o Papa” (Federzoni, 1967).
O
novo governo fascista começa com muitos decretos proclericais e iniciativas,
como a introdução do ensino de religião nas escolas públicas, a exibição do
crucifixo em edifícios públicos, reconstrução de igrejas afetadas pela guerra e
resgata o Bank of Rome, ligado ao Vaticano. Na 5ª reunião do Grande Conselho do
Fascismo (13 de Fevereiro 1923) é aprovada
uma ordem do dia em que proíbe a inscrição de fascistas nas Lojas Maçônicas.
O
início do Estado Totalitário se dá em 03 de janeiro de 1925. Até aquele
momento o Partido Fascista era apoiado
por uma coalizão de forças liberais e Católicas, e o parlamento ainda
representava a oposição. É em 1925 que se dá a extinção de todas as partes
apoiadoras (exceto o partido fascista) e, finalmente, o sistema liberal
democrático. Um passo importante neste processo é precisamente o decreto
proscrição da Maçonaria. A 12 de janeiro Mussolini e o Ministro da Justiça
Alfredo Rocco apresentam um projeto de lei sobre a disciplina das sociedades
secretas, que tem como principal objetivo a eliminação de Maçonaria. O projeto
é discutido no Parlamento, entre os dias 16 e 19 de maio. Neste último dia é
aprovado por voto secreto, com 289 votos a favor e apenas quatro contra. A
importância deste evento é sinalizada pelas discussões calorosas na Câmara,
Mussolini intervém para defender o direito indicando o perigo da Maçonaria, o
qual ele já havia detectado durante a sua militância socialista.
Parte
do discurso dizia: “Não há dúvida de que as instituições do Estado, que
administram a justiça, a educação das novas gerações e que representando as
Forças Armadas [...] sofreram e estão sofrendo, com vicissitudes alternadas, a
influência da maçonaria. A saber inadmissível, e deve terminar” (Susmel, 1956).
O discurso, interrompido por aplausos e vivas conclui com um apelo para
promulgar a lei, independente da possível represália da Maçonaria na Itália e
em todo o mundo. Outros deputados falaram em favor do projeto de lei,
observando que a destruição da Maçonaria representará realização da unidade
espiritual da nação italiana. Nos meses seguintes à promulgação desta Lei medidas que levaram à formação do
regimetotalitário foram implementadas. Começou com a restrição da atividade da
oposição, depois fechamento da imprensa independente, estabelecimento de um
código penal mais restritivo e, finalmente, abolição de partidos políticos e
associações (em outubro 1926).
Gramsci
foi preso no dia 08 de novembro de 1926, juntamente com o outro deputados
comunistas e, após um ano de Confino (prisão domiciliar) é enviado para a
cadeia. O pretexto para completar a virada autoritária levando a Ditadura é o
ataque (descoberto antes que ele acontecesse) contra Mussolini organizado pelo
deputado socialista Tito Zaniboni, em 31 de outubro de 1925. O processo que
envolve diretamente a Maçonaria, incluindo o Grão-Mestre Torrigiani Domizio
(recém- reeleito em 6 de Setembro) e Luigi Capello, pertencentes ao G.O.I. nas
Forças Armadas. A imprensa fascista desencadeou uma campanha anti-maçônica
feroz e os Camisas Pretas atacam a Maçonaria e tentam queimar a sede maçônica
que permaneceu aberta. A seguir todas as lojas do G.O.I. são fechadas e
colocadas na Piazza del Gesù sob “custódia”.
A
grande maioria dos maçons de fato suspendeu todas as atividades, seja por
motivos de força maior ou por convicção, não antagonizar o regime e de acordo
com o sentimento antimasonico dos círculos oficiais. A Igreja Católica e as
forças anti-maçônicas poderiam descansar, pois um velho inimigo tinha sido
eliminado e a Itália, nas palavras o padre jesuíta Enrico Rosa, “tinha se
tornada mais cristã e livre do jugo maçônico “. As negociações entre o Vaticano
e as forças Fascistas são aceleradas entre 1926 e 1929, em paralelo com a
campanha antimasônica, incluindo aí um ataque contra o governo mexicano de
Plutarco Elias Calles (Savarino, 2002). A participação do Vaticano termina em
11 de Fevereiro de 1929, com o Tratado de Latrão, pondo fim à questão Romana e
reconciliando o Estado italiano com a Igreja e o mundo católico. No mês
seguinte (24 de Março), foi realizada eleições nacionais em um “plebiscito”,
produzindo 98% votos para o regime fascista. O sacrifício da Maçonaria,
juntamente com o Partido Popular Don Sturzo, era o preço a pagar para alcançar
este resultado. O custo político para o regime foi relativamente limitado. A
Igreja procurou preservar um espaço exclusivo, defendeu a Ação Católica, que
pedia medidas para proteger a moral pública e, durante as eleições de 1929
recomendou a exclusão de candidatos anticlericais, maçons e outras pessoas
“ruins”.
Por
outro lado, os fascistas filiados à Maçonaria, depois de uma explosão
anticlerical fugaz em 1931, se sujeitaram à disciplina partidária. Os outros
irmãos nunca representaram fator problemático nos 17 anos que se seguiram, até
o colapso do Estado Fascista em 25 de julho de 1943.
A
natureza essencialmente nacionalista do fascismo não era compatível com o
espírito universal da Maçonaria. Mussolini dirigiu a revolução fascista visando
a construção de um “novo homem”, forte, viril e marcial, livre dos vícios do
velho liberalismo cosmopolita, materialista, pacifista e humanitário.
Nesse sentido Mussolini via a maçonaria
como uma ameaça para a construção estrutural o Estado totalitário, por sua
natureza, a sociedade praticamente secreta era potencialmente incontrolável e
exercia influência política considerável.
A
maçonaria com seu caráter peculiar de organização ocultista e esotérica expondo
o mundo das lojas a alegações de atividade ilegal, conspirações e tramas,
levando ao fortalecimento de uma imagem denegrida presente na cultura popular,
assim foi facilmente explorada pela propaganda facista. A Maçonaria era
incompatível com objetivos do Estado totalitário e teve que ser eliminada para
dar espaço a uma nova era do renascimento e da glória nacional.
Na
biblioteca da Associação Brasileira de Imprensa há um livro, de autor ignorado,
intitulado “Fascismo e Maçonaria”. Nele, narra-se a história da presença e
influência da maçonaria na Itália, até o advento do fascismo.
Em
resumo, a palavra de ordem de Benito Mussolini, ditador italiano, era: “Tudo no
Estado, nada fora ou contra ele”. A luta do fascismo contra a maçonaria foi
declarada abertamente pelo Grande Conselho Nacional do Partido Fascista
“considerando-se que os últimos acontecimentos políticos e certas atitudes e
votos da maçonaria apresentam um motivo fundado para admitir que a maçonaria
persegue programas e adota métodos em oposição aos inspirados pela atividade do
fascismo…”. A lei aprovada em novembro de 1925 obrigava todas as associações a
comunicar à polícia seus estatutos, sócios e deliberações, e proibia aos
funcionários públicos de pertencerem às sociedades secretas. Quatro meses
depois se publicou a lei de 3 de abril de 1926, submetendo as associações
sindicais. Por uma motivação análoga (eliminar uma organização influente,
perigosa e incontrolável) o Regime fascista atacou e quase conseguiu destruir a
Mafia siciliana em 1928.
Os
fascistas que eram maçons foram convidados a escolher entre o Partido Nacional
Fascista e a Maçonaria. Para os fascistas não havia uma só disciplina e
hierarquia que não fosse as do fascismo e que havia uma só obediência absoluta,
devota e quotidiana aos chefes do fascismo.
A
maçonaria é uma ordem iniciática presente em todo o mundo e prega a
fraternidade universal, defende o nacionalismo e a independência de cada país,
mas nunca sob intolerância e opressão. O que os regimes totalitários temem é
que em suas Lojas se planejem ações políticas desestabilizadoras e nelas se
reúnam homens que ocupem posições politicamente importantes que poderiam
combater o regime dominante. Onde existir a maçonaria existirá maçons
trabalhando por justiça e pelo bem comum das comunidades.
Honório
Sampaio Menezes, 33º, REAA, Loja Baden-Powell 185, GLMERGS, Porto Alegre, RS,
Brasil.
REFERENCIAS
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Ferdinando. Agli ordini del Serpente Verde: la Massoneria nella crisi del
sistema giolittiano. Roma: Bulzoni, 1990.
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Leone. La Massoneria e la Chiesa Cattolica: un terribile scontro, un possibile
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DI
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em: . Acesso em: 20 ago. 2007.
GIURIATI,
Giovanni. La parabola di Mussolini nei ricordi di un gerarca. Roma-Bari:
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SAVARINO,
Franco; MUTOLO, Andrea. Los orígenes de la Ciudad del Vaticano 1913-1943.
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FEDERZONI,
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Edoardo; SUSMEL, Duilio. Opera Omnia di Benito Mussolini. Firenze: La Fenice,
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SAVARINO,
Franco. Italia y el conflicto religioso en México (1926-1929). Historia y
Grafía, Mexico, n. 18, p. 123-147, 2002.
2 Comentários
Trabalho muito bem feito e pesquisa exemplar. Parabenizo o Ir.'.
ResponderExcluirExcelente Trabalho Desenvolvido Pelo Amigo e Irmão:.
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