Por Antônio Rocha Fadista
O
filósofo grego Pitágoras, que deu seu nome a uma ordem de pensadores,
religiosos e cientistas, nasceu na ilha de Samos no ano de 582 a.C. A lenda nos
informa que ele viajou bastante e que, com certeza, teve contato com as idéias
nativas do Egito, da Ásia Menor, da Índia e da China. A parte mais importante
de sua vida começou com a sua chegada a Crotona, uma colônia Dórica do sul da
Itália, então chamada Magna Grécia, por volta de 529 a.C.
De
acordo com a tradição, Pitágoras foi expulso da ilha de Samos, no mar Egeu,
pela tirania de Polycrates. Em Crotona ele se tornou o centro de uma
organização, largamente difundida, que era, em sua origem, uma irmandade ou uma
associação voltada muito mais para a reforma moral da sociedade do que uma
escola de filosofia.
A
irmandade Pitagórica tinha muito em comum com as comunidades Órficas que
buscavam, através de práticas rituais e de abstinências, purificar o espírito
dos crentes e permitir que eles se libertassem da “roda dos nascimentos”.
Embora o seu objetivo inicial tenha sido muito mais fundar uma ordem religiosa
do que um partido político, a Escola de Pitágoras apoiou ativamente os governos
aristocratas.
A
verdade é que esta Escola chegou a exercer o controle político de várias
colônias da Grécia Ocidental, principalmente as existentes no sul da Itália.
Foi também a sua influência política que levou ao desmembramento e à dissolução
da Escola de Pitágoras. A primeira reação contra os Pitagóricos foi liderada
por Cylon e provocou a transferência de Pitágoras de Crotona para a cidade de
Metaponto, onde residiu até à sua morte, no final do séc. VI ou no início do
séc. V a.C.
Na
Magna Grécia, isto é, nas colônias fundadas pelos gregos na Itália, a Ordem
Pitagórica se manteve poderosa até à metade do séc. V a.C. A partir daí foi
violentamente perseguida, e todos os seus templos foram saqueados e
incendiados. Os Pitagóricos remanescentes se refugiaram no exterior: Lysis, por
exemplo, foi para Tebas, na Beócia, onde se tornou instrutor de Epaminondas;
Filolaus, que segundo a tradição, foi o primeiro a escrever sobre o sistema
Pitagórico, também se refugiou em Tebas.
O
próprio Filolaus, junto com mais alguns adeptos de Pitágoras, retornou mais
tarde à Itália, para a cidade de Tarento, que se tornou a sede da Escola
Pitagórica. Entre eles estava Archytas, amigo de Platão, figura proeminente da
Escola, não só como filósofo como também como homem de estado, na primeira
metade do séc. IV a.C. No entanto, já no final deste século, os Pitagóricos
tinham desaparecido, como Escola Filosófica.
A
ESCOLA PITAGÓRICA
Parece
que, por volta da metade do séc. V a.C., houve uma divisão dentro da Escola, De
um lado, estavam os “matemáticos”, representados por nomes do peso de Archytas
e Aristoxenus, que estavam interessados nos estudos científicos, especialmente
em matemática e na teoria musical; de outro lado estavam os membros mais
conservadores da Escola, que se concentravam nos conceitos morais e religiosos,
e que eram chamados de akousmatikoi (plural de akousmata, os adeptos das
tradições orais). Estes elementos – religiosos e científicos – estavam já
presentes nos ensinamentos de Pitágoras.
As
doutrinas ensinadas por Pitágoras são as seguintes:
1.
- Em primeiro lugar, e acima de tudo, estava a crença de Pitágoras na
existência da alma. Ele também acreditava na transmigração das almas dos
indivíduos, mesmo entre diferentes espécies. Esta transmigração poderia ocorrer
em seres mais ou menos evoluídos. Se um indivíduo tivesse uma vida virtuosa, o
seu espírito poderia inclusive se libertar da carne, isto é, deixaria de
reencarnar. Este conceito filosófico foi atribuído a Pitágoras por Platão, em
sua obra Fédon (que relata os momentos que antecederam a morte de Sócrates pela
ingestão de cicuta). Não se pode deixar de ressaltar a importância deste
conceito na história das religiões.
2.
- Levar uma vida virtuosa consistia em obedecer a certos preceitos, muitos
deles vistos hoje como tabus primitivos, como, por exemplo, não comer feijão ou
não remexer no fogo com um pedaço de ferro. Estritamente morais eram as três
perguntas que cada um devia se fazer ao final do dia, e que eram: Em que é que
eu falhei hoje? O que de bom eu deveria ter feito hoje? O que é que eu não fiz
hoje e deveria ter feito? Um dos principais meios externos que ajudavam a
purificar o espírito era a música.
3.
- A fascinação da Escola pelos números deve-se ao seu fundador. A maior
descoberta de Pitágoras foi a dependência dos intervalos musicais de certas
razões aritméticas existentes entre cordas de comprimentos diferentes,
igualmente esticadas. Por exemplo, uma corda com o dobro do comprimento de
outra emite a mesma nota musical, mas uma oitava acima, isto é, mais aguda.
Tal
fato contribuiu decisivamente para cristalizar a idéia de que “todas as coisas
são números, ou podem ser representadas por números”. Este princípio foi a
pedra de toque da filosofia de Pitágoras. Em sua obra Metafísica, Aristóteles
afirma que os números representavam na filosofia de Pitágoras o que os quatro
elementos – Terra/Ar/Fogo/Água representaram no simbolismo de outros sistemas
religiosos. De acordo com este princípio, todo o universo poderia ser reduzido
a uma ”escala musical e a um número”. Assim, coisas como a razão, a justiça e o
casamento, poderiam ser identificadas com diferentes números. Os próprios
números, sendo ímpares e pares, ou limitados e ilimitados, de acordo com
Aristóteles, se constituíam na primeira definição das noções de forma e de
matéria.
Os
números um e dois encabeçavam a lista dos dez primeiros pares de opostos
fundamentais, dos quais os oito pares seguintes eram “um” e “muitos”, “direita
e esquerda”, “masculino e feminino”, “repouso e movimento”, “reto e curvo”,
“luz e escuridão”, “bom e mau” e “quadrado e oblongo”. Esta era a filosofia do
dualismo metafísico e moral, através da qual se chegou ao princípio que via o
universo como a harmonia dos opostos, no qual “o um” gerou toda a serie de
números existentes.
Assim,
a música e a crença no paraíso estelar, (originalmente associados à Astrologia
da Babilônia) são os pontos de união entre o conteúdo religioso da filosofia de
Pitágoras com os estudos matemáticos e científicos realizados mais tarde pela
ala científica de sua Escola. O primeiro a apresentar um sistema compreensivo
foi Filolaus, um de seus discípulos.
A
ARITMÉTICA PITAGÓRICA
Para
Pitágoras a Divindade, ou Logos, era o Centro da Unidade e da Harmonia. Ele
ensinava que a Unidade, sendo indivisível, não é um número. Esta é a razão
porque se exigia do candidato à admissão na Escola Pitagórica a condição de já
haver estudado Aritmética, Astronomia, Geometria e Música, consideradas as
quatro divisões da Matemática. Explica-se também assim porque os Pitagóricos
afirmavam que a doutrina dos números, a mais importante do Esoterismo, fora
revelada ao Homem pela Divindade, e que o Mundo passara do Caos à Ordem pela
ação do Som e da Harmonia. A unidade ou 1 (que significava mais do que um
número) era identificada por um ponto, o 2 por uma linha, o três por uma
superfície e o quatro por um sólido. A Tetraktys, pela qual os Pitagóricos
passaram a jurar, era uma figura do tipo abaixo:
representando
o número triangular 10 e mostrando sua composição como sendo 1 + 2 + 3 + 4 =
10. Adicionando-se uma fileira de cinco pontos teremos o próximo número
triangular de lado cinco, e assim por diante. Mostrando que a soma de qualquer
série de números naturais que comece pelo número 1 é um número triangular. A
soma dos números de qualquer série numérica composta por números ímpares e que
comece por 2 é um número quadrado. E a soma dos números de qualquer série
numérica de números pares que comece pelo número 2 é um número oblongo, ou
retangular.
Este
é o princípio matemático que levou à 47ª Proposição de Euclides, o matemático
grego que divulgou o Teorema de Pitágoras, pelo qual o quadrado da hipotenusa
de um triângulo retângulo é igual à soma dos quadrados dos dois outros lados,
ou catetos. A demonstração deste teorema é a Jóia do Ex-Venerável mais recente
de uma Loja Maçônica, em homenagem a Pitágoras, e que simboliza a doutrina
científica e esotérica de sua Escola de Filosofia. O mesmo raciocínio usado na
formulação do teorema acima, quando o triângulo retângulo é isósceles, (com
catetos ou lados iguais) levou os Pitagóricos a descobrir os números
irracionais, como, por exemplo, a raiz do número 2, que é igual a 1,4142,,,,
(dízima periódica).
A GEOMETRIA PITAGÓRICA
Em
Geometria não se pode obter uma figura totalmente perfeita, nem com uma, nem
com duas linhas retas. Mas três linhas retas em conjunção produzem um
triângulo, a figura absolutamente perfeita. Por isso é que o triângulo sempre
simbolizou o Eterno – a primeira perfeição, o Grande Arquiteto do Universo. A
palavra que designa a Divindade principia, em todas as línguas latinas, por um
D, e em grego por um “delta”, ou triângulo, cujos lados representam a natureza
divina. No centro do triângulo está a letra Yod , inicial de Jehovah – o
Criador, expresso nos idiomas teuto-saxônicos pela letra G, inicial de God, Got
ou Gottam, cujo significado filosófico é geração.
Numerosas
– e valiosas – foram as contribuições da Escola de Pitágoras no campo da
Geometria. Assim, por exemplo, a demonstração de que a soma dos ângulos
internos de um triângulo é igual a dois ângulos retos, ou 180 graus. Também
formularam a teoria das proporções e descobriram as médias aritmética,
geométrica e harmônica. Foi ainda Pitágoras quem descobriu a construção
geométrica dos cinco sólidos regulares, isto é, o tetraedro ou pirâmide de
quatro lados, o octaedro, o dodecaedro e o icosaedro. A construção do
dodecaedro requer a construção de um pentágono regular, também conhecida dos
Pitagóricos, que usavam o Pentagrama ou Estrela Pentagonal ou Flamígera, como
símbolo de reconhecimento entre os seus membros.
Em
resumo, a Geometria Pitagórica cobriu todos os assuntos da obra de Euclides,
que compilou e registrou todo o conhecimento existente nesta área, na antiga
Grécia.
A ASTRONOMIA PITAGÓRICA
Pitágoras
foi o primeiro a afirmar que a Terra e o Universo tinham forma esférica. Ele
também anteviu que o Sol, a Lua e os Planetas então conhecidos possuíam um
movimento de translação, independente do movimento de rotação diário. A Escola
de Pitágoras desenvolveu também um sistema astronômico, conhecido como sistema
Pitagórico. A última versão deste sistema, atribuída aos discípulos Filolau e
Hicetas de Syracusa, deslocava a Terra do centro do Universo, e fez dela um
planeta do mesmo modo que os planetas então conhecidos, que giravam em torno do
fogo central – o Sol. Este sistema, elaborado cerca de 400 a.C., antecipou em
cerca de 2.000 anos os mesmos princípios defendidos por Galileu Galilei, pelos
quais foi condenado pela Santa Inquisição. Galileu demonstrou a base científica
do sistema, a partir da qual Copérnico e Kepler iriam comprovar que era o Sol e
não a Terra o centro da Via Láctea – a nossa Galáxia.
A MÚSICA PITAGÓRICA
Pitágoras
não só utilizava a música para criar uma inefável aura de mistério sobre si
mesmo, como também para desenvolver a união na sua Escola. A música instruía os
discípulos e purificava suas faculdades psíquicas. Na educação, a música era
vista como disciplina moral porque atuava como freio à agressividade do ser
humano. Pitágoras considerava a música o elo de ligação entre o homem e o
cosmos. O Cosmos era para ele uma vasta razão harmônica que, por sua vez, se
constituía de razões menores, cujo conjunto formava a harmonia cósmica, ou
harmonia das esferas, que só ele conseguia ouvir.
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Pitágoras,
avatar do deus Apolo, compunha e tocava para seus discípulos a sua lira de sete
cordas. Deste modo ele refreava paixões como a angústia, a raiva, o ciúme,
anseios, a preguiça e a impetuosidade. A música era uma terapia que ele
aplicava não só para tranqüilizar as mentes inquietas, mas também para curar os
doentes de seus males físicos.
Pitágoras
foi o descobridor dos fundamentos matemáticos das consonâncias musicais. A
partir daí, ele visualizou uma relação mística entre a aritmética, a geometria,
a música e a astronomia, ou seja, havia uma relação que ligava os números às
formas, aos sons e aos corpos celestes. A Tetraktys era o símbolo da música
cósmica, e Pitágoras, como o deus da Tetraktys, era a única pessoa que podia
ouvi-la. A teoria da música cósmica, ou harmonia das esferas foi descrita por
Platão, no Timeu. Filolau, outro notável discípulo de Pitágoras também faz
descrição minuciosa da teoria que resulta na música cósmica e na harmonia das
esferas (ou planetas).
A HERANÇA DE PITÁGORAS
A
história posterior da filosofia de Pitágoras se confunde com a da Escola de
Platão, discípulo de Sócrates e mestre de Aristóteles, e que foi também ardente
admirador e discípulo de Pitágoras. Platão herdou, de um lado, as doutrinas de
seu mestre e, de outro, bebeu a sua sabedoria nas mesmas fontes do filósofo de
Samos. Segundo Amônio Sacas, toda a Religião-Sabedoria estava contida nos
Livros de Thot (Hermes), onde Pitágoras e Platão beberam os seus conhecimentos
e grande parte de sua filosofia.
Desde
os primeiros séculos da era cristã que é comprovada a existência, em Roma, das
práticas e doutrinas religiosas de Pitágoras, principalmente as relacionadas
com a imortalidade da alma. Pitágoras disputava então, com outras religiões, um
lugar predominante no panteão da Roma Imperial. A comprová-lo as capelas
pitagóricas descobertas pela arqueologia, nas quais os iniciados aprendiam os
mistérios de Pitágoras, e onde eram introduzidos no culto de Apolo.
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Os
afrescos encontrados no sub-solo da Porta Maggiore, em Roma, mostram temas
Pitagóricos. O nacionalismo romano também está ligado a Pitágoras através da
obra Metamorfoses, de Ovídio, que nela relatou a teoria da reencarnação, defendida
pelo filósofo de Samos. Os discípulos diretos de Platão também retornaram aos
princípios Pitagóricos; e os neo-Platônicos, com Jâmblico, no séc. IV d.C.
também os adotaram, juntamente com os mais recentes escritos Pitagóricos, isto
é, os Hinos Órficos. Do séc. I d.C. ao séc. VI d.C. a doutrina de Pitágoras
influenciou grandes filósofos que escreveram e divulgaram a sua filosofia.
Alguns deles foram Apolônio de Tiana, Plotino, Amélio e Porfírio.
Depois
que os cristãos conquistaram, no séc. IV d.C. o controle do Estado, os
Pitagóricos tornaram-se, gradualmente, uma minoria perseguida. No entanto, as
idéias de Pitágoras continuaram a ser pregadas na antiga escola de Platão, a
Academia de Atenas, e em Alexandria, até que no séc. VI d.C. Justiniano, imperador
do Oriente, fechou a Academia e proibiu a pregação da filosofia e das doutrinas
consideradas pagãs pelo catolicismo. A partir desta época prevaleceu a era do
obscurantismo da Idade Média. Mas as doutrinas de Pitágoras foram abertamente
pregadas por um período de 1.200 anos, que se estende do séc. VI a.C. ao sec.
VI d.C.
Apesar
de perseguido pela religião oficial Pitágoras foi, para grandes figuras do
Catolicismo, como Santo Ambrósio, uma figura de referência por ter sido visto
como intermediário entre Moisés e Platão, No séc. XVI, de acordo como o
interesse do autor, Pitágoras era apresentado como poeta, como mágico, como
autor da Cabala, como matemático, ou como defensor da vida contemplativa.
Rafael, famoso pintor italiano, retratou Pitágoras como um homem idoso, de
longas barbas, entre filósofos, no quadro “Escola de Atenas”.
Embora
remotamente, não podemos deixar de registrar a existência de pontos comuns
entre a filosofia de Pitágoras e o sistema Positivista de August Comte.
Pitágoras, racionalista, procurou explicar a cosmogonia universal através da
ciência. Comte trilhou caminho semelhante. Antes de tudo, Pitágoras buscou o
conhecimento da Verdade e só por isso já deve ser reverenciado por toda a
Humanidade
BIBLIOGRAFIA
Pitágoras – Amante da Sabedoria - Ward Rutherford -
Editora Mercúrio - São Paulo
Pitágoras – Uma Vida - Peter Gorman - Editora
Pensamento - São Paulo
A Doutrina Secreta -Volumes II e V - H.P.Blavatsky -
Editora Pensamento - São Paulo
Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e
Simbologia – Nicola Aslan – Artenova - Rio
A Simbólica Maçônica - Jules Boucher - Editora
Pensamento - São Paulo
Maçonnerie
Occulte et L’Initiation Hermétique – J.M.Ragon - Cahiers Astrologiques - Paris
Diálogos - Platão - Abril Cultural - São Paulo
(*) ANTÓNIO ROCHA FADISTA
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Além da vida
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