*Por Barbosa Nunes
Cristina Lopes Afonso nasceu na cidade de Cianorte, norte do estado do Paraná, 518 quilômetros distante de Curitiba. Vivia cercada pelo carinho dos 13 irmãos e cuidado dos pais, Gabriel da Anunciação e Maria Madalena, que lhes deram educação na medida certa para enfrentar a vida. Mudou-se para Curitiba e cursou faculdade de Educação Física. Formou-se precoce aos 19 anos. Na mesma época e de forma muito dolorosa, amadureceu e assumiu uma luta que continua cada vez mais forte em favor das vítimas de queimaduras.
Sua relação com Goiânia começou pela época de 1985, por consequência da convivência com amigos do movimento estudantil da então Executiva Nacional de Estudantes de Educação Física, em que representavam o estado de Goiás, Viviane Brum e Consuelo Ulhoa. Neste relacionamento com Viviane Brum, conheceu seus pais, Ademar Manoel da Silva e Terezinha Brum, ele maçom da Loja “Ordem e Progresso”, de Goiânia. No Paraná já conhecia muitos maçons e em Goiânia, vive a maçonaria através de inúmeras participações em eventos. Considera-se goiana nascida no Paraná, em função de vários motivos que relataremos neste e no próximo artigo. O maior deles foi pela acolhida que teve e tem em Goiás, especialmente do casal Ademar e Terezinha, a quem considera também como seus pais, sobretudo no seu longo tratamento realizado no Hospital de Queimaduras de Goiânia, de renome nacional e internacional, fundado pela competência e humanismo da família Píccolo. Leia mais
É uma história comovente e de persistência. Exemplo de luta pela vida. Em 08 de abril de 2012, o programa “Fantástico”, da Rede Globo, divulgou reportagem de Marcelo Canellas, com repercussão nacional e internacional, que transcrevemos neste artigo, sobre uma sobrevivente que se tornou vanguardista.
“História de alguém que enfrentou obstáculos que pareciam insuperáveis e venceu. Mulher que há mais de 20 anos teve o corpo praticamente inteiro queimado pelo namorado. Enfrentou 24 cirurgias, se recuperou e hoje dá um exemplo de solidariedade. Furioso com o rompimento, o ex-namorado jogou álcool nela e riscou o fósforo”.
Sobre aqueles instantes trágicos, Cristina diz: “O sentimento é de morte. O sentimento do fogo nas chamas é de morte. Na hora pensei que tudo acabasse ali”.
“A revelação do crime revoltou Curitiba. Cristina Lopes Afonso teve o corpo incendiado pelo namorado, quando tinha 20 anos. As queimaduras atingiram 85% da jovem professora de Educação Física. Ela passou por 24 cirurgias plásticas. O caso emocionou o Brasil e foi um marco na luta pelos direitos da mulher”.
De viva voz no “Fantástico”, afirmou: “Aprendi da maneira mais dura, infelizmente, vivendo esta violência no meu próprio corpo”.
“Em 1989, em julgamento histórico, o agressor, médico Wilson Miashiro, pegou 13 anos e 10 meses de prisão. Foi o primeiro caso de tentativa de homicídio com vítima viva. Foi julgado em tribunal do júri, com o réu recebendo condenação exemplar”.
O “Fantástico”, informou que depois do julgamento, Cristina foi morar em Goiânia, e sobre o trauma de uma vítima de queimadura, ela falou: “Acabando o momento principal da dor, que é o da ferida aberta, e começando a cicatriz, ai vem a dor emocional, que é portar uma cicatriz”.
27 anos após a agressão que sofreu hoje está à frente de uma organização especializada justamente em tratar de cicatrizes emocionais. O Núcleo de Proteção aos Queimados foi criado porque Cristina não conseguia ficar indiferente cada vez que se deparava com uma história que parecia com a sua. Fez faculdade de fisioterapia e decidiu dedicar-se na reabilitação de vítimas de queimaduras graves. Sempre é encontrada tratando e conversando com pacientes.
Sofrida, emocionada, mas determinada no percorrer o caminho que Deus traçou, assim se pronunciou: “Preconceito é a maior dificuldade das vítimas”. Como fisioterapeuta, Cristina trabalha diretamente na reabilitação física dos pacientes no mesmo hospital em que foi atendida há mais de duas décadas. O seu exemplo pessoal é que traz os melhores resultados.
“O pessoal me olha e fala: “Poxa vida, ela está bem, está trabalhando, eu também posso chegar lá, se ela conseguiu, eu também consigo”. “O sucesso do tratamento faz com que Cristina seja convidada para falar em faculdades do país inteiro.
“Um convite especial a comoveu. Dar aula para os alunos do médico que a operou de graça em 1988. O professor Ivo Pitanguy realizou nela duas cirurgias. Uma de reconstrução da mama e outra na boca”.
Momento altamente emocionante registrado pelo “Fantástico”, foi quando Cristina entrou em sala de aula e em silêncio total a aguardava na primeira fila, o renomado professor, cientista, escritor e cirurgião plástico, Ivo Pitanguy.
Cristina, às lágrimas, lembrou a época em que andou de hospital em hospital buscando respostas. Ao conhecer Pitanguy ouviu pela primeira vez o médico fazendo perguntas.
“O que te incomoda? O que você quer melhorar em você?”. “Não era o olhar do cirurgião para mim, era meu olhar para mim mesma. Você quando lida com paciente que é queimado, você não está sozinho, você está com a vontade do doente também”.
Finalizando a entrevista, o repórter Marcelo Canellas, se expressou: “A força de uma história pessoal é o que Cristina tem a oferecer, seja para os que vão curar, seja para os que esperam a cura”.
Recentemente a visitei em seu gabinete de trabalho na Câmara Municipal de Goiânia, acompanhado de milha filha Isabella Brandão Barbosa e por ela recebido ao lado de seu pai adotivo, Ademar Manoel da Silva. Irradiava determinação, compromisso e firmeza total na defesa dos seus princípios e das vítimas de queimaduras. No próximo artigo, registrarei detalhes de sua luta, do seu encaminhamento para Goiânia, sugerido pelo médico homeopata e médium Márcio, que recebeu mensagem da mãe de Cristina, falecida dois anos antes do trágico acontecimento: “Leve-a para Goiânia, ela não deve ficar aqui”.
Doutora Cristina, como é conhecida, surpreendeu na última eleição para Câmara Municipal, quando foi eleita vereadora, sendo a mulher mais votada em Goiânia, superando seis mil votos e não sendo votada em apenas quatro urnas. A respeito de sua atividade como fisioterapeuta no Hospital de Queimaduras de Goiânia, é encontrada todas as manhãs realizando cerca de trezentos curativos. Sobre suas aulas, palestras e defesa de princípios éticos na política, falaremos no próximo artigo, concluindo este com as suas palavras, do fundo do coração, de compromisso e solidariedade:
“Me vejo como uma pessoa capaz de lidar com isto, mas ao mesmo tempo vulnerável a isto, e em condições de ajudar alguém. A queimadura me levou a acreditar que eu sou alguém que posso contribuir na mudança da vida de alguém”.
Antecipadamente ao Dia da Mulher, a ser comemorado no dia 8 de março, homenageio as mulheres na pessoa desta guerreira, Cristina, nome que significa “ungida pelo Senhor”. Certamente o Senhor esteve ao seu lado para superar tantas dores.
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