Da Redação
Introdução
A Maçonaria no estado de São Paulo ocupa uma posição singular na história da fraternidade no Brasil. Detendo quase um quinto de todos os maçons do país, a maçonaria paulista tornou-se um campo fértil para a formação de diversas obediências ao longo dos séculos XIX e XX. Este fenômeno, impulsionado por disputas políticas internas e pela busca de autonomia, moldou o cenário maçônico paulista e influenciou sua estrutura organizacional até os dias atuais.
As Primeiras Organizações Maçônicas em São Paulo
A Maçonaria brasileira passou por um ciclo de dissolução e renascimento desde 1822, sendo restabelecida em 1831 com a criação do Grande Oriente Brasileiro pelo Senador Vergueiro. Esse período inicial foi marcado por conflitos e disputas, incluindo a reativação do Grande Oriente do Brasil (GOB) por José Bonifácio, que antes havia sido um crítico da própria organização.
A criação do Grande Oriente Provincial de São Paulo, em 1833, foi uma das primeiras tentativas de estruturar a maçonaria no estado. Posteriormente, em 1873, foi fundada a Grande Loja Provincial de São Paulo, vinculada ao GOB, que existiu até 1879. Essas organizações demonstram a busca constante de autonomia dos maçons paulistas, que ansiavam por maior independência administrativa em relação ao poder central da Maçonaria brasileira.
A Fragmentação da Maçonaria Paulista
A partir do final do século XIX, a fragmentação tornou-se uma característica constante da Maçonaria paulista. A criação do Grande Oriente do Estado de São Paulo (GOESP), em 1893, foi um marco significativo, representando a primeira potência maçônica soberana do estado. Essa organização surgiu a partir da insatisfação de algumas lojas com a administração do GOB. Contudo, sua existência foi efêmera, sendo dissolvida poucos anos depois.
O início do século XX testemunhou novas tentativas de estruturação. Em 1901, surgiu o Grande Oriente do Estado de São Paulo (GOESP-GOB), vinculado ao GOB, que teve como seu primeiro Grão-Mestre Carlos Reis. Mais tarde, em 1921, devido a descontentamentos com o GOB, houve uma nova cisão e a fundação do Grande Oriente de São Paulo (GOSP). Esse movimento demonstrou um padrão que se repetiria frequentemente: disputas políticas e insatisfação com os processos eleitorais dentro do GOB geravam divisões e novas potências maçônicas.
O Crescimento da Concorrência e a Consolidação da GLESP
Em 1927, após uma crise interna no GOB envolvendo o Supremo Conselho do Grau 33, houve a fundação da Grande Loja do Estado de São Paulo (GLESP). Diferente do GOSP, que teve uma origem conturbada, a GLESP nasceu da iniciativa de lojas que buscavam maior autonomia dentro do Rito Escocês Antigo e Aceito. O primeiro Grão-Mestre da GLESP foi novamente Carlos Reis, demonstrando sua influência sobre a estrutura maçônica paulista por décadas.
Entre as décadas de 1950 e 1970, a GLESP passou por um período de disputas internas e fragmentação. Em 1950, um grupo dissidente tentou fundar uma segunda GLESP, levando à criação da Grande Loja Unida de São Paulo (GLUSP), que existiu até 1959. Outro episódio semelhante ocorreu em 1974, quando duas facções dentro da GLESP reivindicaram simultaneamente o título de Grão-Mestre.
O Papel do GOSP na Formação da COMAB
A década de 1970 foi marcada por um dos eventos mais significativos para a Maçonaria brasileira: a criação da Confederação Maçônica do Brasil (COMAB). Em 1973, após um processo eleitoral conturbado dentro do GOB, diversas potências estaduais decidiram romper com a estrutura central e formar uma nova organização. O GOSP foi uma das potências fundadoras da COMAB, mas enfrentou resistência interna, com parte de suas lojas optando por permanecer no GOB. Esse processo levou à criação de dois GOSPs paralelos, um federado ao GOB e outro independente.
Diante desse cenário de instabilidade, em 1981 foi fundado o Grande Oriente Paulista (GOP) como uma alternativa para aqueles que haviam saído do GOSP. Esse novo Grande Oriente surgiu como um meio de garantir a continuidade da Maçonaria paulista ligada à COMAB, caso houvesse decisões judiciais que favorecessem o GOB.
Os Desdobramentos Contemporâneos
A relação entre o GOB e as potências da COMAB sempre foi conturbada. Em 2014, o GOB declarou os Grandes Orientes da COMAB como irregulares, proibindo qualquer intervisitação. Essa política gerou atritos internos, culminando em novas divisões. Em 2018, mais uma crise eleitoral no GOB levou à desfederalização do GOSP, tornando-o novamente independente.
Para neutralizar o crescimento do GOSP, o GOB reverteu sua postura e, em 2018, firmou tratados de reconhecimento com os Grandes Orientes da COMAB que ele havia repudiado anteriormente. No entanto, essa manobra política criou um novo cenário de rivalidades e alianças estratégicas, fragmentando ainda mais o cenário maçônico paulista.
A história da Maçonaria paulista é uma crônica de divisões, disputas e reconfigurações constantes. Desde o século XIX, a busca por autonomia e a insatisfação com processos eleitorais dentro do GOB levaram à criação de diversas obediências e potências maçônicas no estado.
Os padrões históricos demonstram que as cisões e reunificações dentro da Maçonaria paulista são cíclicas. Assim como o GOSP se desfez do GOB em diversos momentos, há sempre a possibilidade de um novo retorno, assim como ocorreu no passado. Além disso, o papel de figuras centrais, como Carlos Reis, demonstra que indivíduos podem ter influência decisiva na conformação das estruturas maçônicas.
Por fim, a proliferação de potências em São Paulo também sugere que a concorrência tem sido um motor para o crescimento da Maçonaria no estado. Enquanto a competição trouxe avanços organizacionais e evitou abusos de poder, a falta de transparência nos processos eleitorais ainda é um problema que impacta diretamente a estabilidade da Maçonaria paulista e brasileira. Se os líderes maçônicos conhecessem melhor sua própria história, talvez pudessem evitar a repetição dos mesmos erros e construir um futuro mais coeso para a fraternidade.
Este artigo foi inspirado no conteúdo A(S) MAÇONARIA(S) PAULISTA(S) publicado pelo blog No Esquadro, de autoria do Irmão Kennyo Ismail.
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