VAN GOGH – DA VIDA TURBULENTA À TURBULÊNCIA CÓSMICA!

Por Andréa B. de Oliveira
O texto de hoje me é muito caro e, de antemão, aviso ao leitor que não sou expert em artes, mas apenas uma grande admiradora do genial Van Gogh.
 Conheci o Impressionismo ainda muito jovem. Era criança quando uma professora, a quem admirava muito, D. Jocimara, pediu-me uma pesquisa sobre a vida e a obra de Manet. Fiquei tão fascinada que comecei a ler tudo que falasse sobre Impressionismo. Foi assim que Vincent Van Gogh entrou na minha vida pra ficar! Nem vou falar aqui sobre Romantismo e Realismo tendo em vista que, além de não querer me estender demais e acabar por fugir do meu objetivo, estou ansiosa pra falar do grande gênio!
 Manet
Em meados do século XIX, Manet apresenta seu novo quadro “Almoço na relva”, e foi um verdadeiro escândalo. O quadro se tratava de um piquenique, um evento cotidiano, ao invés de um momento histórico, ou religioso, ou mitológico, que era o que a academia esperava. As pinceladas eram livres e esboçadas, e o pintor tinha uma preocupação muito maior com as luzes e as sombras do que com os detalhes. Manet ganhou a simpatia dos pintores mais jovens por romper com as regras rígidas de retratar com perfeição e detalhes realísticos. E esses jovens, entre eles Monet, Renoir e Degas, encantados com a ousadia de Manet, seguiram seus passos e começaram a pintar a vida cotidiana ou a natureza, e saíram dos estúdios para pintar ao ar livre. Alguns anos depois, fizeram sua primeira exposição e Monet (não confundir com Manet) apresentou seu quadro chamado “Impressão: Alvorecer”. Um crítico de arte, inconformado com a nova forma de pintar, apelidou o grupo, em tom pejorativo, de Os Impressionistas, em alusão ao quadro de Monet. Entre as críticas que receberam, eram chamados de preguiçosos que não queriam terminar seus quadros ou mesmo de incapazes. Mas os pintores, se utilizando da mesma ironia, mas também porque concluíram que era um bom nome, dois anos depois fizeram nova exposição e se auto intitularam Impressionistas. É necessário que eu explique, ainda que de forma leiga, como se dava a pincelada dos artistas impressionistas. No desejo de reproduzir as cores como são reproduzidas na natureza, os impressionistas, se queriam representar o verde, por exemplo, não se utilizavam de uma pincelada de verde, mas davam duas pinceladas bem próximas, uma azul e outra amarela, a fim de que a mistura das duas cores se fizesse em nossos sentidos, em nossa mente. Importante dizer também que o Impressionismo não é um contraponto ao Realismo, e sim que nasceu, cresceu e se definiu dentro do Realismo.

Em 30 de março de 1853, nos Países Baixos, nasceu Vincent Van Gogh, filho do pastor calvinista Theodorus e de Anna Cornelia Carbentus. Vincent teve uma vida marcada por fracassos em todos os aspectos da vida que eram importantes na época. Não conseguia manter sua subsistência, se relacionou de forma turbulenta com sua família e tinha muitas dificuldades de sociabilidade. Vincent teve mais dois irmãos e três irmãs, mas só conseguiu estabelecer uma relação mais profunda com seu irmão mais novo, Theodorus Van Gogh. O jovem Vincent começou a trabalhar para um comerciante de arte indicado por um tio, mas, na época, só se interessava por estudos religiosos, foi demitido. O rapaz trabalhou ainda numa livraria, trabalho que durou pouquíssimo tempo, tentou entrar para a faculdade de Teologia, mas fracassou, depois tentou a Escola Missionária Protestante onde também fracassou e, em 1879, começou a trabalhar como missionário em uma comunidade pobre de mineiros, na Bélgica. Em 1880, Vincent que demonstrava muito gosto pelas artes, foi incentivado por seu irmão Theo, com quem trocava cartas com bastante regularidade, a seguir os estudos de pintura. É então quando o genial Van Gogh começa a surgir! Esse jovem pintor carrega consigo os momentos que passou entre os camponeses durante o trabalho de missionário nas minas de carvão. Graças a esses momentos, carrega consigo uma forte empatia e solidariedade pela vida humilde dos camponeses e o ápice do seu trabalho nesse período é o quadro “Os comedores de batata”.

“Os comedores de batata”.
Sua vida foi de agruras, decepções e desgraças e, com certeza, isso influenciou na sua arte! Van Gogh foi influenciado também, e muito diretamente, pelo Impressionismo e pelo Japonismo. Esse último, ele conheceu na França através de gravuras de Hokusai e Hiroshigue. Aqui vale uma digressão para os nerds que amam cultura japonesa, Hokusai é o precursor dos mangás como nós os conhecemos. Na primeira metade do século XIX, Hokusai fez um conjunto de obras com 15 volumes chamados Hokusai Manga que representa os primeiros passos para as “histórias em quadrinhos” no Japão.

A Grande Onda – Hokusai
Mas voltando a Van Gogh… Entre as  mais de 800 pinturas que Van Gogh nos deixou, uma é especialmente impressionante, “A Noite Estrelada”! Esse quadro foi pintado enquanto Vincent estava internado no asilo Saint-Rémy-de-Provence por problemas psicológicos sérios que o levavam a apatia e depressão. É também, durante essa internação que Van Gogh rompe com o Impressionismo e desenvolve um estilo próprio onde prevalecem as cores primárias, principalmente o amarelo, e a bidimensionalidade. Inicia-se a fase Pós-Impressionismo. Mas o que há de tão especial nesse quadro? Vários elementos do quadro nos remetem a própria história de vida do pintor. O campanário da igreja se sobressai em meio às casas da pequena aldeia de Saint-Rémy, possivelmente, uma marca de sua crença religiosa, sua espiritualidade exacerbada. Há quem chame atenção também para a coincidência de que há onze estrelas no céu e em Gênesis 37: 9 está escrito “Depois teve outro sonho e o contou aos seus irmãos: Tive outro sonho, e desta vez o sol, a lua e onze estrelas se curvavam diante de mim”. A sensação de isolamento também é uma característica marcante do quadro. Mas o que mais me chama a atenção, e também de alguns cientistas, são as nuvens espiraladas e a turbulência na luminosidade das estrelas. Presença, nesse quadro, que me faz pensar na própria vida turbulenta do pintor.

A Noite Estrelada – Van Gogh
Nesse ponto, Van Gogh, Matemática e Física se encontram de forma surpreendente e como você nunca imaginou!
Turbulência, para um cientista físico ou matemático, é um fenômeno que ocorre na água quando um navio aciona a hélice ou no ar durante o voo de uma aeronave. (Essa turbulência, da qual estou falando, é autossemelhante, ou seja, um turbilhão maior transfere energia em cascata para turbilhões menores e assim sucessivamente em outras escalas menores, o que nos lembra dum texto recente meu sobre Fractais – parte 1 e parte 2). Durante a viagem do telescópio Hubble, cientistas observaram o fenômeno da turbulência em nuvens de poeira estelar e gás e lembraram-se do quadro “A Noite Estrelada” de Van Gogh. O quadro virou objeto de pesquisa, foi digitalizado e analisado pelo modelo matemático de Kolmogorov, cientista russo que estudou o fenômeno. Descrevendo o modelo de forma simplificada, o cálculo avalia a chance de cada ponto, ou pincelada, ter o mesmo brilho ou luz. Pois bem, é nesse ponto que nós nos impressionamos! Os efeitos de luminosidade que Van Gogh dava às suas obras continham cálculos exatos e uma precisão que só é encontrada na natureza! Analisando outras obras, os cientistas perceberam que Van Gogh só conseguiu atingir esse traço de genialidade sob o efeito da crise mental. E na minha mente sã passam as seguintes perguntas:

Existe loucura ou se trata de uma percepção maior da natureza e dos fenômenos naturais? Loucura ou genialidade?

Talvez sejamos detentos da nossa própria sanidade… Talvez a loucura seja o espaço para criar e ser livre…

 “O que sou eu aos olhos da maioria das pessoas? Uma não entidade, ou um homem excêntrico e desagradável – alguém que não tem e nunca terá posição na vida, em suma, o menor dos menores. Muito bem, mesmo que isso fosse verdade, devo querer que o meu trabalho mostre o que vai no coração de um homem excêntrico e desse joão-ninguém.” – Carta de Vincent ao irmão Theo (21 de julho de 1882).

Mas a humanidade ainda não estava pronta pra isso!
*Van Gogh se suicidou, tendo vendido apenas um quadro em toda sua vida. Após sua morte, seus quadros passaram a valer uma fortuna e estão, desde então, entre as obras mais caras já avaliadas.

FONTE: https://transversos.wordpress.com/

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