Por Kennyo Smail
Estava eu outro dia conversando com um irmão
e amigo que pertence a outra Loja e Obediência, esta tão regular e tradicional
quanto a da qual sou membro. Era nosso primeiro encontro após uma visita que ele
havia feito à minha Loja. Papo vai, papo vem, e eis que o irmão pergunta se
poderia indicar um candidato para ingressar em minha Loja. Eu, conhecendo a
idoneidade moral desse irmão, respondo afirmativamente. Afinal de contas, é
direito de todo Mestre Maçom regular indicar candidatos e, se ele havia
escolhido a minha para realizar a indicação, era motivo de honra para
mim. Porém, a dúvida ficou no ar, e logo questionei o irmão do porquê
dele não realizar a indicação em sua própria Loja, já que eu sabia que ele era
inclusive o Secretário da Loja, e poderia acompanhar o processo para a
Iniciação mais de perto.
Tenho que confessar que a resposta não me
surpreendeu muito, visto ser algo cada dia mais comum de ser visto na Maçonaria
Brasileira: o irmão se queixou de sua Loja, dizendo que a mesma está sem
conteúdo, reunindo-se apenas para bater malhete, isso quando não está ocupada
com brigas internas e externas; reclamou ainda que toda tentativa dele e de
outros irmãos mais novos de inovar é frustrada pelos “donos da Loja”. E tendo o
irmão visitado algumas vezes nossa Loja e observado seu modus operandi,
se sentia mais à vontade para indicar um amigo no qual enxergava os princípios
maçônicos básicos e o interesse no aperfeiçoamento moral e espiritual.
Compreendendo a situação do irmão, reafirmei
minha concordância e disponibilidade em avalizar tal indicação em minha Loja,
dizendo que seria para nós uma honra receber o futuro afilhado dele, é claro
que após a devida sindicância e seguindo todos os trâmites de costume. Ao tocar
no assunto, o irmão aproveitou para perguntar como era nosso processo de
sindicância, os documentos, exigências e custos para ingresso na Loja. Sendo
ele um irmão sempre muito interessado e participativo, não me incomodei de
explicar todo o processo, desde a indicação até a iniciação. Ao final, informei
ainda o valor do investimento para Iniciação, o qual cobre o kit de Aprendiz
(avental, luvas, ritual, broche, identidade, diploma, etc.) e um jantar
comemorativo em que o iniciado e sua família são apresentados a toda a família
da Loja.
Nesse momento, vi o espanto no rosto do
irmão, que logo exclamou que o valor informado era exorbitante, impraticável, e
que o processo para iniciação era muito burocrático. Ao escutar tais
comentários, perguntei-me como era possível fazer o mesmo com menos tempo e
recursos… não contive a curiosidade e questionei: – E como é em sua Loja? – O
irmão então me respondeu que sua Obediência estava dispensando muitas das
exigências para a Iniciação, além de isentar os candidatos da taxa do placet.
Por conta disso, sua Loja consegue fazer todo o processo para Iniciação em
apenas um mês, e cobra apenas R$50,00 do candidato.
Após escutar o irmão, fiquei refletindo por
um momento sobre o assunto. Eu já conhecia essa história “de outros carnavais”
e meu raciocínio era de que, de uma certa forma, um valor mais substancial, o
processo relativamente demorado, e as exigências documentais como quase de um
concurso de policial federal, serviam como filtros, peneiras, para separar os
curiosos daqueles realmente interessados. Todos aqueles documentos, entrevistas
e consultas teoricamente garantiam a qualidade mínima social e moral dos
indivíduos que pleiteiam ingresso na Maçonaria. Mas, será que aquela fórmula “fast
food” de Maçonaria estava funcionado para a Loja dele e outras Lojas
daquela Obediência?
O que a Loja dele e outras da Jurisdição
estavam fazendo, com a anuência da Obediência, era proporcionar aos profanos um
acesso rápido e barato à Maçonaria. É o que podemos chamar de “McMaçonaria”. A
questão é se isso é realmente bom para os membros e para a Instituição.
Pensando nisso, perguntei ao Irmão quantos membros haviam iniciado na Loja dele
nos últimos dois anos. Ele respondeu que algo em torno de 50 novos irmãos. –
Uau – imaginei. Então perguntei a ele a média de membros por reunião
atualmente. Ele sabia bem: uns 26 a 28 irmãos, a maioria de irmãos mais
antigos, apenas uns 10 membros da “nova safra”. Então lancei a pergunta
derradeira… – E você sabe o nome desses 50 irmãos? – A resposta, é claro, foi
negativa. – Talvez eu saiba de uns três deles – o irmão me respondeu.
Isso já era de se esperar… Como dito
anteriormente, essa ideia não é nova. Algumas Grandes Lojas dos EUA já haviam
tentado algo parecido alguns anos atrás, porém de forma mais intensa e
abrangente e, é claro, foi um fracasso. Não somente causou alguns problemas
internos, como também impactou na relação com outras Grandes Lojas no mundo,
que não gostaram nem um pouco dessa história.
Com a tática da McMaçonaria, a tal Obediência
deve ter aumentado consideravelmente o número de seus filiados. Já as Lojas que
abriram mão do conceito de células de “família maçônica” não obtiveram ganhos
reais em troca. Talvez, membros promissores, que se identificariam com a Loja e
seus valores quando em sua forma tradicional, se entregam à desmotivação de
serem mais uns entre dezenas e, ao frequentarem a Loja, que perde sua própria
identidade, acabam por também se afastarem. Os agora maçons, que adquiriram um
“lanche” rápido e barato de Maçonaria, podem por fim não experimentar,
degustar, saborear e aproveitar a verdadeira essência da Ordem. Enfim, a curto
prazo parece algo ótimo, mas a longo prazo pode ser prejudicial, assim como uma
alimentação à base de fast food.
Fonte: No Esquadro
1 Comentários
Como sempre, reflexões mais que pertinentes para o bem de nossa Fraternidade
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