A PERGUNTA DO MAÇOM


José Maurício Guimarães

Vou contar uma história que servirá como ponto de partida para nossas reflexões.

Pouco antes de morrer, no leito do hospital onde estava internada, Gertrude Stein de repente abriu os olhos e disse:

“Qual é a resposta?”

Um de seus amigos que lhe faziam companhia aproximou-se e disse:

“Mas Gertrude..., se você não disser qual é a pergunta, como vamos lhe dizer qual é a resposta?”

Gertrude Stein abriu os olhos e retrucou:

“Então, qual é a pergunta?”.

A maçonaria* nas Lojas, nas Potências e principalmente na internet está cheia de respostas. Temos respostas e professores para tudo. Deixamos de ser uma Ordem de homens em busca da verdade para sermos um ringue (uma rinha de galos) onde curiosos se digladiam na defesa de minúsculas “certezas” ou na proteção de cargos e posições.


Apesar de todos os esforços, ainda não alcançamos nossas pretensões, pois não sabemos o que estamos buscando. Não sabemos QUAL É A PERGUNTA. Proliferam os ritos, as ordens, os paramentos, as cores e os aventais, os colares e os chapéus. Mas não sabemos qual é a pergunta.

É premissa ou axioma que o homem só encontra algo se souber o que está procurando. Necessariamente e evidente!, apesar de tantos sabichões e oportunistas que pululam por aí. Diz o velho ditado: “quem tem boca vai a Roma”, ou seja: para encontrar o caminho que leva a Roma, você tem que PERGUNTAR: “onde está Roma? como faço para chegar até lá? onde é Roma?” ‒ seja no sentido literal e arcaico (quando os viajantes andavam pelas estradas perguntando a todos os transeuntes e em cada estalagem), seja no sentido moderno: quem quiser ir a Roma hoje, terá que PERGUNTAR na agência de turismo ou nas empresas de transporte sobre o preço e as datas das partidas aéreas ou marítimas. Um turista que não sabe QUAL É A PERGUNTA sobre a viagem que quer fazer, não chegará a lugar nenhum. Digo mais: para bem chegar a Roma, é importante perguntar-se antes: “o que é Roma?”



Voltemos nossa atenção para 2.400 anos atrás; ouçamos o que disse Platão no Diálogo “Górgias”:

É vergonhoso que, estando na situação em que evidentemente estamos, tenhamos a pretensão de crer que somos algo ‒ nós que nunca temos certeza, nem opinião permanente acerca das mesmas coisas e questões; e o que é pior: não temos certezas nem opiniões a respeito de questões de suma importância.”

Todos vocês, como bons buscadores, já leram ao menos uma das obras de Platão; sabem, portanto, que o personagem central dos Diálogos de Platão é Sócrates, filósofo ateniense que viveu de 469 a.C. - 399 a.C.. Sócrates não tinha respostas prontas, pois afirmava só saber que nada sabia. Seu método consistia na investigação (pesquisa filosófica) mediante diálogos (contato e discussão entre dois ou mais indivíduos). Nesses diálogos, os participantes alcançavam, por si mesmos, um nível de reflexão e descoberta dos próprios valores (ou verdades). O método socrático partia de perguntas simples com o objetivo de revelar, primeiramente, as contradições na forma usual de pensar; em seguida, com perguntas mais aprofundadas, os participantes eram levados a pensar POR SI MESMOS e alcançarem valores fundamentais (metafísicos) e o autoconhecimento. **



A maçonaria nas Lojas e nas Potências deveria funcionar assim; a Maçonaria (construção do homem interior) foi criada para tal finalidade e tudo que ultrapassa esses limites pode até ser interessante ‒ ilustrativo, culto, bonito, emocionante e chique; mas não é “a Maçonaria”.

 ( * ) Quem está acostumado com meus textos, sabe que uso “maçonaria” com “m” minúsculo para indicar o substantivo, pelo método diacrônico, que indica o trabalho ou a “arte dos pedreiros” da qual nossas oficinas aproveitam o simbolismo. Escrevo “Maçonaria” com “M” maiúsculo ao me referir à arte, ciências e disciplina filosófica que balizam os cânones mais elevados ‒ os padrões de pensamento inerentes ao sistema iniciáticos, independente de Potências ou Lojas.

( ** ) Principais Diálogos de Platão: “A República”, “Crítias”, “Fédon”, “Fedro”, “Górgias”, “Mênon”, “O Banquete”, “Político”, “Protágoras”, “Sofista” e “Timeu”. Todos esses livros podem ser baixados gratuitamente no site “Domínio Público” http://www.dominiopublico.gov.br  ‒  não há razão para desconhecê-los.


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