José Maurício Guimarães
Há mais de 10 anos venho cumprindo um
estranho e enfadonho “ritual” que se agrava no mês de agosto: trata-se daquela
repisada história de o dia 20 de agosto não ser o verdadeiro “dia do maçom”.
‒ Oh! Caramba!, Caraca!, De novo?!
Barbaridade!, Arre!, Argh!, Uau!, Uai!, Socorro!, Raios!, Quê?!, Que coisa!,
Puxa!, Putz!, Poxa!, Pelas barbas do patriarca!, Opa!, Nossa!, Macacos me
mordam!, Crêmdeuspai!, Chi!, Céus!!!
Apesar de muitos terem apreciado a minha
pesquisa, houve alguém ‒ ou alguéns ‒ tachando minhas reflexões sobre a
História como “assunto estéril”. Não faz mal: os dicionários definem a palavra
“estéril” como algo ou alguém “que nada produz; que não dá frutos; árido,
improdutivo, incapaz de procriar; infecundo e infértil”. Mas definem também o
“estéril” como algo (ou alguém) livre de germes; asséptico, esterilizado ou
preservado ou imune a germes patogênicos. Nesse segundo aspecto é que me
incluo: sou um maçom livre de crendices, imune aos germes patogênicos ‒ que
podem provocar, direta ou indiretamente, a doença da burrice.
Por isso insisto mais uma vez no assunto,
para honra e glória da maçonaria brasileira que não merece ser sufocada pelos
erros do passado.
Batatas para os chiliques histéricos das
viúvas do agastamento e das mágoas da velhíssima república.
Não se assustem, pacientes leitores ‒ mas o dia 20 de
agosto, ao contrário do que muitos pensam, não é o autêntico e
histórico Dia do Maçom. É uma longa história que teve início com
um equívoco cometido por José Maria da Silva Paranhos (Visconde do Rio
Branco e Grão-Mestre do GOB) ao interpretar incorretamente as
datações maçônicas. A relação entre o calendário oficial (Era Vulgar) e o
cômputo dos dias adotado pela antiga Maçonaria (Anno Lucis) foi desconsiderada
pelo Visconde.
Visconde que merece ouvido, só o “de
Sabugosa”, criado pelo Monteiro Lobato ‒ apesar de ter palha na cabeça e corpo
de espiga de milho.
A desordem teria parado nessa “cronologia” se
infundadas decisões não viessem se somar às já anteriormente cometidas.
No século dezenove a Maçonaria adotava
oficialmente o ano da Verdadeira Luz ‒ Anno Lucis ou Year of Light ‒
conforme a crença de que o mundo fora criado em 4000 a.C. Dessa forma, os
maçons contavam os meses e dias de acordo com o calendário “da natureza”,
começando o ano em Nissan(nome do mês judaico) que marca a
primavera no hemisfério norte e outono no sul.
No calendário judaico, os meses podem ter 29,
30 ou 31 dias dependendo da lua nova. Por isso as festas judaicas são
móveis: Korban, Pesach, Shavuot, Rosh
Hashanah, Yom Kippur, Hanukkah, etc. Pela mesma
tradição, a Páscoa católica é celebrada no primeiro domingo seguinte à primeira
lua cheia eclesiástica que ocorre, entre nós, no equinócio de outono
(março/abril); o Corpus Christi vem 60 dias depois da Páscoa e
assim por diante.
Entre os dias 17 de junho e 25 de outubro de
1822 foram realizadas dezenove sessões no Grande Oriente do Brasil. Entre essas
sessões, a do vigésimo dia do 6º mês da verdadeira luz de 5822, ou seja – no
dia 9 de setembro de 1822. Nessa sessão de 9 de setembro de 1822 os maçons, sem
terem tomado conhecimento do que acontecera em São Paulo dois dias antes (7 de
setembro), atenderam à moção de Joaquim Gonçalves Ledo (Primeiro Vigilante,
empunhando o primeiro o malhete na ausência do Grão-Mestre José Bonifácio de
Andrada e Silva) e proclamaram, em Loja, a Independência, cuja legalização
iriam submeter e atribuir a D. Pedro.
Naquele tempo, a distância entre o Ipiranga
(São Paulo) e o Rio de Janeiro era de aproximadamente 7 a 10 dias, a cavalo.
Mas as notícias vinham nos lombos de simples mulas (hoje as notícias são
divulgadas por mulas). Portanto, a proclamação da Independência,
intelectualmente articulada dentro do Grande Oriente e o vibrante discurso de
Gonçalves Ledo aconteceu no dia 9 de setembro, quando o “grito” já havia sido
dado às margens plácidas do Ipiranga. Ledo e os demais maçons só tomaram
conhecimento disso mais tarde.
Conta-nos o padre Belchior (mineiro de
Diamantina, grande amigo e confessor de D. Pedro), em carta de 1896, que no dia
7 de setembro de 1822, o Príncipe D. Pedro mandou-o ler em voz alta as cartas
trazidas de Portugal. Ali mesmo, do Ipiranga às margens plácidas, tremendo de
raiva, D. Pedro arrancou das mãos do padre os papéis e, amarrotando-os,
pisou-os sobre a relva. “D. Pedro – diz textualmente a carta ‒ caminhou alguns
passos, silenciosamente, acompanhado por mim, Cordeiro, Bregaro e outros, em
direção aos nossos animais, que se achavam à beira da estrada. De repente
estacou-se, já no meio da estrada, dizendo-me: ‒ Padre Belchior, eles o querem
e terão a sua conta. As Cortes me perseguem, chamam-me, com desprezo, de
rapazinho e brasileiro. Pois verão agora o quanto vale um rapazinho. De hoje em
diante estão quebradas nossas relações: nada mais quero do governo português e
proclamo o Brasil para sempre separado de Portugal! E arrancando do chapéu o
laço azul e branco, decretado pela Corte como símbolo na nação portuguesa,
atirou-o ao chão, dizendo: ‒ Laços fora, soldados! Viva a independência, a
liberdade, a separação do Brasil. E – prossegue o padre Belchior – “galopou,
seguido de seu séquito, em direção a São Paulo (...) mal apeara da besta, D.
Pedro ordenou ao seu ajudante de ordens que fosse às pressas ao ourives Lessa e
mandasse fazer um dístico em ouro, com as palavras “Independência ou Morte”,
para ser colocado no braço, por um laço de fita verde e amarela." (*)
Cem anos mais tarde, o Grande Oriente do
Brasil tornou público e oficial o Ato que mostrava ser o 7 de Setembro
correspondente ao 20º dia do VI mês. [...] “O grito de Independência ou Morte,
dado pelo Príncipe Regente nas margens do Ipiranga, 7 de Setembro de 1822... VI
mês do ano de 5822 e proclamação da Independência votada nas sessões do Grande
Oriente do Brasil a 9 e 12 de setembro do mesmo mês” etc...
Em 1994, durante a reunião anual dos Grão-Mestres
das Grandes Lojas da América do Norte, foi aprovada a data de 22 de fevereiro
como Dia Internacional do Maçom... isso porque em 22 de fevereiro de 1732
nascera George Washington, expoente da independência dos Estados Unidos e
criador do sistema de Grandes Lojas estaduais na América. No ano seguinte, o
GOB aderiu a essa ideia (Decreto Nº 003, de 10 de fevereiro) e passou a
comemorar o Dia Internacional do Maçom em 22 de fevereiro. Mas o famigerado 20
de agosto prevaleceu.
Por que?
Apesar da cronologia, um maçom de Santa
Catarina encaminhou, de boa-fé, uma proposta à reunião da Confederação das
Grandes Lojas realizada em Belém entre os dias 17 e 22 de junho de 1957,
sugerindo o dia 20 de agosto como Dia do Maçom “por ter sido a data da
proclamação da independência dentro de um templo maçônico”. Equivocou-se, e os
presentes à reunião aceitaram, na febre do entusiasmo e também de boa-fé, a
velha e canhestra interpretação de José Maria da Silva Paranhos. Acertaram
quanto ao mês, mas erraram quadraticamente quanto ao vigésimo dia.
As potências brasileiras se conformaram com o
20 de agosto, data que não coincide com os fatos históricos.
Mas não se amofinem... podemos comemorar o
“dia do maçom” em qualquer dia do ano. Eu comemoro DIA DA MAÇONARIA o ano
inteiro ‒ durante os 365 dias e 24 horas por dia, pois “GRANDE É A MAÇONARIA!
GRANDE É O ESPÍRITO DA MAÇONARIA”.
Seja Assim!
(*) Não se assustem aqui também:
O verde “das matas”, o amarelo “do ouro”, o
azul “do céu” são meras interpretações poéticas. Na verdade, o verde é a cor da
Casa de Bragança, herdeira de Avis (D. Pedro I), sendo o amarelo a Casa dos
Habsburgos, da qual Leopoldina, esposa de D. Pedro I, era filha. Na bandeira de
1820, confeccionada por Jean-Baptiste Debret, foram acrescentados ramos de café
e de tabaco junto a um círculo azul (na emblemática simboliza a lealdade e a
justiça) com dezenove estrelas representando as províncias, além da Cruz da
Ordem de Cristo e a esfera armilar, insígnia das grandes navegações. (trecho do
meu livro “Grande Loja Maçônica de Minas Gerais- História, Fundamentos e
Formação” (2014).
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