(*)
Ir\ Carlos Alberto Carvalho Pires, M.M.
1-
A práxis para o estudo de qualquer assunto maçônico envolve o desenvolvimento
de uma pequena jornada no tempo e espaço, em busca dos elementos seminais que
determinaram a síntese subjetiva que vemos hoje. Toda obra arquitetônica
definitiva se entrelaça ao primeiro traço na prancheta, onde jazem os
verdadeiros fundamentos.
2-
Lançar nosso olhar pós-moderno sobre idéias que se cristalizaram ao longo de
milênios de conhecimento acumulado, como as existentes no 18º Landmark de
Mackey (1.856), pode ser uma atitude temerária. Temos que considerar as
diferentes formas de interpretar a realidade que definem o pensamento humano ao
longo de toda evolução histórica. Assim alcançamos a acesze intelectual
que brota das luzes emblemáticas da Ágora de Hiram, rumo à
sublimação.
3-
Podemos dividir a evolução do pensamento humano em cinco fases distintas, todas
simbolicamente representadas em Loja. O Venerável-Mestre traduz o Homem
Primordial ou primeiro Homo sapiens, que estabeleceu as bases das
tradições esotéricas. O Primeiro Vigilante é o Homem Greco-Romano,
aquele que codificou os grandes temas político-filosóficos do mundo ocidental.
O Segundo Vigilante se mostra como o Homem Medieval, cujo espírito se acomodava
sob o dossel da transcendência divina. No Oriente existe a figura do Homem
Moderno, com sua crença absoluta na razão esclarecida, incorporado pelo Orador.
Por fim temos aquele que quebrou todos os paradigmas de fé, seja na natureza,
na religião ou na ciência – é o Irmão Secretário irrompendo entre Colunas como
metáfora do Homem Pós Moderno.
4-
Estas cinco Colunas basilares da Oficina estabelecem cinco retas entre si que
criam uma figura geométrica justa, quando conectadas. A chamada estrela
pentalfa representa um sistema dinâmico onde o macro e o microcosmo se
fundem. Esta síntese psíquica gira no sentido dextrógiro, em torno do altar dos
juramentos, como uma cruz gamada absorvendo energias do universo. A união
alquímica entre as mentes antigas e as atuais, dos grandes pensadores do
passado e dos iniciados contemporâneos, se torna uma realidade simbólica.
5-
A estrela do conhecimento repentinamente trava seu movimento, tal qual o
astro-rei nos solstícios. Seu eixo aponta para o altar do Venerável Mestre. A
partir deste ponto começaremos nossa jornada meditativa, focando a mente do
Primeiro Homem. Nesta fase não existiam casas, cidades, reinos nem qualquer
forma de organização social. Os homens vagavam errantes pela mãe África.
Caçando e colhendo frutos, gozavam uma vida paradisíaca.
6-
Apesar da aparente paz, os grandes questionamentos sobre os fenômenos naturais,
biológicos e filosóficos já inquietavam a arena psicológica dos pioneiros.
Nossos antepassados concluíram que devia haver uma realidade paralela
imperceptível aos cinco sentidos. Esse outro mundo estaria na penumbra, como um
universo oculto, determinando nossos destinos.
7-
A beira do completo caos psíquico que estas angústias traziam, surgiu a
redenção. Um determinado membro do grupo, dotado de carisma profético, assumiu
seu bios político bradando que podia explicar os mistérios
ocultos. Este sábio, mago, druída, sacerdote ou bruxo afirmava entender o
conjunto de idéias desconexas que fogem à compreensão racional. Para dar
sentido a estes pensamentos inquietantes seria preciso regrá-los,
enquadrando-os em procedimentos ritualísticos elaborados.
8-Os
rituais primordiais ocorriam em cavernas profundas, à luz de tochas. O xamã
fazia pinturas artísticas nas paredes, reproduzindo pictogramas, além de
figuras de animais e de entes antropozoomórficos. Só participavam dos trabalhos
aqueles que eram convidados, pois nem todos apresentavam as mínimas
qualificações espirituais para compreender esta visão expandida da realidade.
Surgiam as chamadas “comunidades dos escolhidos”- ekklesia em
grego.
9-Os
sábios perceberam que para decifrar um mistério era preciso vivenciá-lo:
tinham que encarar o poder de frente e vencê-lo, voltando ilesos das
jornadas cheias de riscos a que se submetiam. A forma de se trabalhar estas
angústias, sem submeter os voluntários a riscos reais, seria interpretá-las
através de narrativas simbólicas.
10-Para
definir a essência dos temas mitológicos, consideraram a existência de certas
idéias que operavam em aparente antagonismo, mas que mantinham estreita conexão
de sentidos. Estabelecendo uma relação dialética, dois conceitos – tese e
antítese – acabavam se assimilando em um terceiro, que incorporava elementos
das duas proposições anteriores. Como exemplos destes sistemas temos o dia e a
noite, a vida e a morte, o finito e o infinito, o micro e o macrocosmo, o sol e
a lua e muitos outros. Toda ritualística tinha que incorporar apenas um dos
pólos desta relação para ter efetividade. A partir desta escolha se
estabelecia a tradição a ser seguida e respeitada ad aeternum.
11-Muitas
vertentes esotéricas consideraram a dualidade macho/fêmea e as estações do ano
para a construção das narrativas. Sabemos que existem duas fases distintas a
cada giro da Terra em volta do Sol. A primeira seria voltada ao reinado da
vida, da luz, do calor e da abundância, que engloba a primavera e o verão. A
segunda se refere às estações onde impera o frio, a fome, as doenças, o medo, e
a morte – falamos do outono e do inverno.
12-A
vida vegetal, que floresce nas épocas de Sol e decai nos meses de trevas, brota
do ventre da Terra assim como os animais nascem do ventre de suas mães. A
Terra, assim, assumia o epíteto de Mãe-Terra ou Deusa. Os cultos primordiais
eram dedicados a esta figura poderosa, com forte ligação às coisas da natureza.
Repletas de signos relativos à fertilidade, estas ordens tinham nas
sacerdotisas a fonte de veneração. Destacam-se os cultos à Isis, à Innana, à
Hera, à Ceres, à Maria Madalena e à Minerva.
13-O
principio fertilizador, necessário ao advento da vida, era o Sol. Isso porque
quando ele se afasta, a vida fraqueja. No inverno o astro praticamente morre.
Seu óbito ocorre metaforicamente no solstício de inverno, em 21 de dezembro. E
quando o Sol falece, deixa viúva a Mãe-Terra. Restam apenas no deserto gelado
alguns troncos perenes, os “troncos-da-viúva”, e raras folhagens que resistem às
intempéries, como as acácias.
14-Outros
grupos resolveram não adotar o conceito ontológico da Mãe-Terra. As narrativas
deviam transcender o reino telúrico e chegar, triunfantes, aos céus. Criaram-se
os mitos solares. O Sol passava a ser o protagonista das narrativas. Nestes
procedimentos, o herói tem um nascimento tumultuado, depois passa por
inacreditáveis situações de risco, sendo muitas vezes lançado em rios,
enclausurado em arcas ou berços improvisados. Após uma juventude misteriosa,
tem um momento de “iluminação”, quando ouve um chamado.
15-Este
é o estopim para o início de uma viagem em que o iniciado vai resgatar algo que
era legitimamente seu, mas que foi usurpado por uma força injusta. Repleta de
perigos, esta epopéia geralmente leva os bravos aos confins do oriente. Lá está
o objeto de redenção, que se desdobra em várias figuras arquetípicas, como o
cálice sagrado, a pedra filosofal e a palavra perdida. Depois de achar o que procurava,
e derrotar o maior dos adversários – um ente que representa as forças
primitivas e elementares da natureza – o conquistador retorna são e salvo ao
seu grupo, fortalecido e equilibrado.
16-A
viagem heróica é uma metáfora do processo de individuação. Representa a busca
pela identidade que todos devem empreender para atingir a maturidade. O homem
tem que conhecer o papel individual que lhe foi reservado, e que vai marcar sua
fugaz passagem pela vida. Esta sabedoria só é possível através do autoconhecimento,
fenômeno acessível apenas àqueles que adentram aos mais profundos labirintos de
nosso subconsciente.
17-Toda
experiência maçônica nada mais é do que uma complexa e elaborada jornada
psíquica: trafegamos do mundo consciente, simbolizado pelo Ocidente, aos planos
mais profundos do inconsciente, representado pelo Oriente. Os trabalhos
ritualísticos traduzem a busca atemporal por aquilo que foi perdido em tempos
imemoriais. A falta deste objeto intangível nos torna seres incompletos e
eternamente angustiados em nossa subjetividade
18-Assim como Mitra, Apolo, Krishna, Rama, Gilgamesh, Hórus, Teseu, Prometeu e Hércules, nosso herói Hiram Abiff é um mito solar. Todos personificam o pólo masculino, positivo e ativo da relação dialética entre macho e fêmea. Por esta opção ancestral realizada pelos primeiros doutrinadores de nossa Ordem apenas homens devem ser escolhidos para vivenciar, na plenitude, as experiências místicas inerentes ao universo simbólico da sagrada Arte Real.
18-Assim como Mitra, Apolo, Krishna, Rama, Gilgamesh, Hórus, Teseu, Prometeu e Hércules, nosso herói Hiram Abiff é um mito solar. Todos personificam o pólo masculino, positivo e ativo da relação dialética entre macho e fêmea. Por esta opção ancestral realizada pelos primeiros doutrinadores de nossa Ordem apenas homens devem ser escolhidos para vivenciar, na plenitude, as experiências místicas inerentes ao universo simbólico da sagrada Arte Real.
Referências:
1-Campbell,
J. “Mitologias Primitivas”, 7ª Edição, Editora Palas Athena, 2005
2-Campbell,
J. “O Poder do Mito”, 1ª Edição, Ed. Palas Athena, 1990;
3-Glesp,
“Ritual do Simbolismo do Aprendiz Maçom”, 2.001;
4-MacDowell,
J “Saber Filosófico, História e Transcendência”, Ed.Loyola, 2.002;
5-Jung,
C.G. “Psicologia e Alquimia”, 2ª Edição, Editora Vozes, 1994;
6-Pires,
C.A.C., “Origens – em busca do primeiro maçom”, revista maçônica “A Verdade”,
editada pela Glesp, Ano LV, edição No 461, julho/agosto 2007
7-Pires,
C.A.C. “O Simbolismo Maçônico em Stonehenge”, site “Pietre Stones –
Review of Freemasonry” http://www.freemasons-freemasonry.com/stonehenge_maconaria.html
(*) Irmão Carlos
Alberto Carvalho Pires, M.M.
cacpires@gmail.com
A.R.L.S. Acácia de
Jaú 308 – Or de Jaú SP
FONTE:
MAÇONARIA DO BRASIL
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