QUEM FORAM OS
SADUCEUS
Por
uma série de motivos, qualquer comentário que se faça sobre a seita judaica dos
saduceus será sempre problemático. Primeiro porque não se descobriu, até agora,
um único documento escrito que se refira a esse grupo para fornecer informações
de primeira mão sobre eles. Depois, ao que parece nenhum membro dessa seita
jamais escreveu, ou por outra forma transmitiu, ou guardou para a posteridade
qualquer informação que pudesse nos dar uma idéia exata de quem foram, no que
acreditavam e qual foi a contribuição deixada para a rica cultura judaica. Dos
fariseus sabemos que pelo menos Paulo de Tarso, os evangelistas e outros
escritores cristãos fazem fartas referências em seus escritos. O historiador
Flávio Josefo também se confessou fariseu e deu, em seus trabalhos, muitas
informações que nos permitem fazer uma idéia de quem foram, o que pensavam e
como viviam. Também nos escritos rabínicos que instruem a Mishná encontramos
fartas referências a esses sectários judeus que tanto incomodaram Jesus e seus
seguidores.
Da
mesma forma, o material hoje coletado nos pergaminhos do Mar Morto nos dão uma
boa idéia de quem foram os essênios e como viviam esses fanáticos sectários que
são hoje considerados os possíveis inspiradores de Jesus e João Batista.
Mas
os saduceus permanecem desconhecidos. O pouco que sabe sobre eles provém das
parcas referências que a eles é feita no Novo Testamento e nos textos de Flávio
Josefo, ambos, diga-se de passagem, carimbados por claras influências
ideológicas.
Apesar
do conflito já apontado entre Jesus e os fariseus, que deu a eles uma aura
completamente desfavorável, a literatura rabínica, de um modo geral os tem
apresentado sob uma ótica bastante simpática, concedendo-lhes o privilégio de
aparecer como depositários da tradição oral da sabedoria de Israel. Já os
saduceus não gozam do mesmo destaque, e os parcos registros rabínicos que se
referem a eles, são praticamente silentes em relação a qualquer atividade que
se refira a esse grupo. Dessa forma, a identidade histórica desse grupo é
difícil de reconstituir.
Toda
os registros constantes da literatura rabínica posterior ao Novo Testamento se
refere aos saduceus como sendo oponentes doutrinários dos fariseus e
simpatizantes do helenismo. No Talmude babilônico, por exemplo, os saduceus
chegam a ser considerados hereges.
O
pouco que sabe sobre os saduceus é que se tratava de um grupo muito elitista de
judeus, que detinha um certo poder político na época de Jesus. Era um grupo
político- religioso, que à semelhança dos fariseus disputava doutrinariamente
com os fariseus e dividia com estes o poder político e os cargos
administrativos na Judéia.
Flávio
Josefo informa que os saduceus, da mesma forma que os fariseus, já existiam nos
tempos do monarca asmoneu Jônatas (160-143 a. C.) e diz que outro monarca dessa
dinastia, João Hircano (134-104 a.C), os favoreceu em seu governo. Segundo
ainda esse autor, os saduceus teriam exercido forte influência sobre os reis
asmoneus durante todo o período de governo dessa dinastia. Tanto quanto se
sabe, Herodes, o Grande, que governou a Palestina durante os quarenta anos
anteriores ao nascimento de Jesus e cerca de seis anos após a sua morte, não
gostava muito dos saduceus, preferindo escolher seus Sumo-Sacerdotes na seita
dos fariseus.
Os
saduceus voltaram ao poder quando Roma assumiu o governo direto da Judéia. Os
prefeitos, e mais tarde os procuradores que Roma colocava para governar os
judeus freqüentemente se apoiavam no poder dos sacerdotes para manter o
controle sobre o belicoso e rebelde povo judeu. E como os saduceus, já de longa
data tinham fama de colaboracionistas, simpatizantes da filosofia grega, foi
nessa seita que eles foram buscar os seus colaboradores. Anás e Caifáz,
responsáveis pela prisão e condenação de Jesus, o primeiro como principal
membro do Sanedrin e o segundo como Sumo Sacerdote, eram saduceus.
Os
saduceus, diferente dos fariseus, ao que parece não sobreviveram á destruição
de Jerusalém, efetuada pelos romanos em 70 d.C. A literatura rabínica não os
menciona depois dessa data.
Segundo
informa Flávio Josefo, a seita dos saduceus era minoritária e não tinha muitos
adeptos. Também não faziam questão de divulgar suas doutrinas para o povo, como
faziam os fariseus. Era uma seita essencialmente elitista que congregava
somente pessoas de alguma fortuna ou poder. Era, portanto, o grupo que
representava a aristocracia da Judéia.
O
nome saduceu sugere que esse partido tinha origem nas famílias sacerdotais da
antiguidade. Sadoc era o nome do sacerdote que serviu Davi e Salomão, conforme
informa a Biblia. Com base nisso os saduceus costumavam reivindicar a primazia
da hierarquia. Chamavam a si mesmos de filhos de Sadoc e nessa condição sempre
procuravam estar perto do poder, influenciando-o ou mesmo exercendo-o
diretamente.
Os
saduceus, portanto, pode ser considerado como sendo um grupo
político-religioso, formado por aristocratas judeus, centrado em Jerusalém e
controlando os ofícios do Templo.
Há
poucas referências aos saduceus no Novo Testamento. Eles aparecem uma única vez
discutindo com Jesus a questão da reencarnação, que segundo os evangelistas e
também Flávio Josefo quando se refere à essa seita, eles refutavam. Isso mostra
o quanto os saduceus se mantinham afastados da vida popular, preferindo
concentrar suas atenções na política. Nos Atos dos Apóstolos eles reaparecem
mais uma vez no julgamento de Pedro perante o Sinédrio.
AS CRENÇAS DOS
SADUCEUS
Os
saduceus rejeitavam as teses dos fariseus, segundo a qual a tradição também
fazia lei. Eles diziam que somente a Torá escrita era lei e devia ser cumprida.
Talvez esse caráter conservador dos saduceus seja o motivo pelo qual Jesus teve
menos conflitos doutrinários com eles do que com os fariseus, pois Jesus também
era um conservador, que acreditava que a Lei de Moisés a única lei que devia
ser respeitada.
Na
Mishná os saduceus sempre aparecem em clara oposição aos fariseus em relação á
questões de culto, comportamento, e até liturgia. Discordam sobre as duras
regras de pureza que os fariseus dizem ser obrigatórias, e também têm idéias
diferentes sobre responsabilidade civil, à maneira como respeitar o sábado,
etc.
A
questão sobre a inexistência da ressurreição dos mortos parece ter a principal
divergência doutrinária entre os saduceus e os fariseus e deles com Jesus. De
fato, como a Torá não fala em ressurreição, os saduceus se recusavam a
admiti-la. Pelo menos é a que mais transparece no Novo Testamento e nas
referências que Flavio Josefo faz a respeito de deles.
Mas
na verdade, em se admitindo que os saduceus rejeitavam essa crença, isso nos
leva a deduzir que eles rejeitavam toda a doutrina escatológica dos judeus que
sustentava uma consumação final de tempo, com um apocalipse e um conseqüente
julgamento de vivos e mortos bem como a recompensa final para crentes e o
castigo para os descrentes, como se acreditava na época de Jesus e como ele
mesmo pregava. E por inferência é duvidoso que os saduceus acreditassem até
mesmo na vinda de um Messias redentor para livrar os judeus do jugo estrangeiro
e fundar um novo reino, fosse lá o que fosse esse reino do Messias. Isso
explica o rigor com que eles julgaram Jesus e o verdadeiro prazer com que eles
o entregaram aos romanos para que o crucificassem.
Isso
não significa, entretanto, que os saduceus não tivessem qualquer tipo de
esperança numa renovação do estado judaico e numa nova era de liberdade e
prosperidade para o povo judeu. Certamente acreditavam nisso, mas não como uma
esperança messiânica como esperavam os fariseus e principalmente os essênios.
Os saduceus eram políticos e atuavam politicamente, sustentando no direito
positivo as suas atitudes. E sendo Anás e Caifás, e o Sinedrin judeu composto
por uma maioria saducéia, se entende o porque da prisão e condenação sumária de
Jesus. A sua pregação era, sem dúvida, perigosa para a ordem pública então
vigente e da qual eles eram os principais fiadores.
Os
saduceus, conforme denuncia o evangelista Lucas e Flávio Josefo também
confirma, não acreditavam na existência de anjos e espíritos e negavam a
existência de um destino a determinar a vida dos homens. Ao contrário eram
ardorosos defensores do livre arbítrio, sustentando que tudo estava nas mãos
dos homens. Essas eram idéias francamente gregas, por isso se diz que os
saduceus eram simpatizantes do helenismo.
OS SADUCEUS E A
MAÇONARIA
Talvez
até mais que os fariseus e os essênios, a seita dos saduceus pode ser invocada
para fornecer uma interessante analogia com a maçonaria moderna. Em primeiro
lugar temos a noção elitista que informa a cooptação dos membros da Ordem. Essa
noção sugere que o maçom há de ser uma pessoa de certa proeminência em seu
ambiente social para que ele, ao integrar o seleto grupo para o qual foi
convidado possa acrescer, com suas condições e qualidades, ao poder potencial
do grupo.
Conquanto
muitos maçons possam não concordar com a nossa tese, a maçonaria é,
essencialmente um grupo de poder. Tal como os iniciados dos Antigos Mistérios,
o que se busca fazer na maçonaria é uma seleção natural de pessoas com
potencial material e espiritual para compor uma “central de energia”, para a
qual se possa canalizar as esperanças da sociedade nos momentos em que ela
precisar. Nesse sentido é que nós vemos a maçonaria como um reserva cultural da
sociedade e justificamos inclusive a sua aparência extremamente conservadora.
Suas ligações com a política, sua interferência nas questões sociais, a discussão
dos grandes temas que se referem á vida da sociedade estão, dessa forma,
inseridos na própria missão a que ela se propõe cumprir. Daí muitas vezes, como
fariseus e saduceus na história política e religiosa dos judeus, os maçons
serem vistos com desconfiança por pessoas e instituições que nada sabem os
Obreiros da Arte Real.
A
par disso, a influência das seitas judaicas na estrutura da maçonaria nos
parece bastante clara. Elas estão na estrutura das Lojas, formadas no estilo
das antigas corporações de ofício, mas com uma clara conformação emprestada da
mitológica “Assembléia Sagrada” dos judeus. No caráter de Irmandade que se dá à
associação; na estrutura corporativa da instituição, com sua mútua (espécie de
seguro), seus institutos, sua história e todo seu simbolismo iniciático,
podemos identificar que o arquétipo fundamental que inspira a maçonaria é
realmente a antiga e venerável nação de Israel. E nisso, a seita dos saduceus,
como também os essênios e os fariseus, é parte importante. Por merece ser estudada
POR IRMÃO JOÃO ANATALINO
FONTE: RECANTO DAS LETRAS
BIBLIOGRAFIA
Biblia
Sagrada: Os Evangelhos Sinóticos e Atos dos Apóstolos-Barsa Ed. 1986
Flavio
Josefo: antiguidade dos Judeus- Kgreger Publications- USA-1995
Mishná-Comentários-
Pengoin- Zahar Ed. 1987
J
P Meyer- Um Judeu Marginal- Tomo III- 2004
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