Getúlio embalado para presente

CULTURA
Por Marino Boeira

Do Sul21

Você é assinante da Revista Caras? Nos jornais, procura em primeiro lugar a coluna social? É ligado em fofocas envolvendo artistas globais e socialites? Então, temos uma recomendação muito especial para lhe fazer: não deixe de ler Getúlio – 1882 – 1930 – Dos anos de formação à conquista do poder – o primeiro volume da substanciosa biografia de Getúlio Vargas, escrita por Lira Neto e lançado este ano pela Companhia das Letras.  Se você gostar – e certamente vai gostar – terá ainda muita leitura por muitos anos, porque o segundo volume está previsto para 2.013 e o terceiro para 2.014. Leia mais
Quem leu a biografia de Hitler, escrita por Ian Kershaw e imaginou que Getúlio seguiria pela mesma linha, com uma análise interpretativa da vida social e econômica brasileira nas primeiras décadas do século XX, que fizesse o leitor entender as causas das constantes revoltas que marcaram o período, com destaque para o tenentismo e a Coluna Prestes, perdeu seu tempo. O autor, em vez disso, prefere se ater a detalhes pessoais da vida de Getúlio, interessantes para quem se preocupa em conhecer a intimidade das grandes figuras históricas, mas um pouco decepcionantes para quem imaginava que o livro ajudaria a definir até que ponto uma figura extraordinária como foi Getúlio Vargas influenciou na vida brasileira. Aqueles que acreditam nos ensinamentos de Plekhanov (Gueorgui  Plekhanov – 1856-1918) sobre o papel da individuo na história, ponto capital na visão marxista sobre até onde os homens podem mudar os acontecimentos, teriam certamente novos argumentos a favor de seus pontos de vista  a partir de uma avaliação real sobre o papel de Getúlio Vargas na história brasileira.
Mas, certamente, esta não era a idéia do autor e seus editores. Mais do que um maquiavélico, como sempre foi pintado pelos partidários e opositores, Lira Neto, pelo menos no prime iro volume de sua obra, mostra Getúlio quase como um arrivista, sempre disposto a fazer um jogo duplo e até mesmo a trair os amigos. A chamada Revolução de 30, para o autor, só aconteceu por obra e graça de Osvaldo Aranha , Flores da Cunha e João Neves da Fontoura, que empurraram Getúlio para o confronto com Washington Luis.  Mesmo que Getúlio, as vezes, acendesse uma vela a Deus e outra ao Diabo, o certo é que foi sempre ele quem determinou os tempos do movimento que levou o Partido Republicano do Rio Grande do Sul, da aliança com o Governo Federal, ao confronto armado.
Dos revolucionários de 30, a crer no livro de Lira Neto, João Neves parece ter sido a figura mais importante e coerente, mesmo que dois anos depois tenha se aliado aos paulistas contra Vargas na chamada Revolução Constitucionalista. Na linha de uma historiografia preocupada mais com os fatos cotidianos envolvendo seus personagens, do que a infraestrutura em que eles estão inseridos, o livro de Lira Neto é extremamente agradável de ser lido e suas mais de 600 páginas correm céleres sob nossos olhos. Pena que extensa bibliografia que consultou, sirva ao autor apenas para ricas descrições da aparência de fatos e personagens, mas pouco ajuda no entendimento das razões reais da Revolução de 30.
Um bom exemplo desse estilo pode ser visto neste perfil que traça de Getúlio Vargas no trem que levava os revolucionários em direção ao Rio de Janeiro: “O homenzinho pequenino e barrigudo se transfigurara, no imaginário da revolução, em guerreiro garboso, que conquistava a admiração dos cavalheiros e arrancava suspiros das damas. Para adotar o figurino mais apropriado a uma campanha revolucionária, logo depois de deixar a capital gaúcha, Getúlio trocara os trajes civis pelo uniforme militar de brim cáqui. A indumentária, contudo, não lhe caíra bem. O abdômen proeminente ficou ainda mais manifesto quando circundado pelo grosso cinto de couro preto, que destacou sua silhueta cada vez mais roliça. As botas de cano longo, que iam até quase a altura dos joelhos e formavam uma espécie de balão duplo na calça comprida embocada dentro delas, pareciam encurtar ainda mais a pernas miúdas.”
O livro sobre Getúlio é apresentado num papel de ótima qualidade, capa mais dura que o habitual e muitas fotos do personagem, desde menino até o revolucionário de 30. Embalado num papel colorido, se presta muito para presentear um amigo em seu aniversário. O amigo certamente vai gostar muito. Mesmo que depois não leia o livro, ele vai fazer bonito em uma estante de sua biblioteca.

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