OS MAÇONS E AS ESTRELAS DO CINEMA


 Dominique Alain Freymond - Tradução J. Filardo

Discreta ou claramente exibida, a Maçonaria tem estado presente desde o início da sétima arte com figuras como John Wayne, Clark Gable, Douglas Fairbanks, Gordo e Magro, Monty Python e mais perto de nós a famosa série dos Simpson … Rede de pensamento iniciático ou Instrumento de propaganda, o cinema cristalizou os medos e as aspirações da sociedade.

No mundo anglo-saxão, especialmente nos Estados Unidos, os maçons estão integrados na vida social e associativa.  Falar sobre isso, até mesmo parodiar parece muito natural. Na Europa, as duas guerras mundiais marcaram as mentalidades e percepções. A propaganda de Vichy, franquista ou hitlerista tomará como alvo a Maçonaria,  então proibida. As alusões à Ordem são menos frequentes e mais discretas, exceto pelos filmes de propaganda antimaçônica.  Ainda hoje, uma desconfiança em relação aos Irmãos continua amplamente compartilhada pela população e por certas mídias, mesmo que essa imagem seja relativizada.

Alguns números
Para entender melhor como a Maçonaria é vista através do filtro do cinema, foram analisados 164 obras. Há certamente mais, mas a documentação sobre este assunto continua a ser muito limitada.  Dos 130 filmes, 19 séries de TV, 10 documentários e 5 filmes de animação, produzidos entre 1915 e 2017, mais de dois terços vêm da América do Norte e o restante, principalmente da Europa.  Mais da metade são filmes de ação ou policiais, seguidos por comédias, documentários e filmes de fantasia ou ficção científica.  Confrontados com as ideias da Maçonaria, 52% são neutros, 29% são muito críticos, até mesmo denunciam a Maçonaria e 19% a apresentam sob uma luz favorável. Encontramos em 69 filmes, símbolos claramente identificáveis, um diálogo explícito ou até mesmo uma cerimônia maçônica (incluindo 6 vezes uma iniciação).

Os Maçons, promotores da criação e a ascensão do cinema nos Estados Unidos

Do outro lado do Atlântico, os maçons desempenharam um papel de liderança na criação e expansão da indústria cinematográfica. Louis B. Mayer, produtor, criará, com Sam Goldwin, o Metro Goldwin Mayer (MGM) em 1924.  Também produtor, Jack Warner, fundador do famoso Warner Bros Studio em 1923, será um membro da Loja Mount Olive de Los Angeles. Darryl Francis Zanuck pertencerá à mesma loja; ele será o co-fundador da empresa que se tornará a 20th Century Fox. E podemos continuar a lista: A Universal Pictures foi fundada em 1912 por Carl Laemmle; a Paramount Pictures Corporation foi criada por Cecil Blount DeMille em 1916, enquanto que a United Artists foi lançada por Douglas Fairbanks e David Griffith. Essas empresas – MGM, Warner Bros, 20th Century Fox, Universal Pictures, Paramount Pictures e United Artists – estão ou estiveram em destaque entre as maiores empresas de produção e realização dos Estados Unidos. O cinema, técnica emergente no início do século XX, será de interesse para os maçons, que o verão como um meio de contribuir para a emancipação das massas através do acesso à cultura. Essa forte representação dos Irmãos também é encontrada no nível dos atores.  Pensaremos imediatamente em John Wayne, membro da Ordem Molay, depois da Loja Mc Daniel Lodge No. 56, no Arizona, e finalmente Shriner. Norvell “Oliver” Hardy também era irmão, mas Laurel não era, ao contrário do que às vezes se escuta. Entre as grandes estrelas de Hollywood, os enormes Ernest Borgnine e Clark Gable pertenciam à Maçonaria.

As luvas brancas de Mickey
Walt Disney foi iniciado na Ordem Templária de Molay em 29 de maio de 1920. Alusões à sua pertença à Maçonaria são às vezes mencionadas, erroneamente, em conexão com as luvas brancas de Mickey. 

Promoção de valores maçônicos 
Encontramos a ideia da luta do bem contra o mal, declinada na luta da luz contra as trevas ou a lei contra a ilegalidade. Essa estrutura é encontrada em quase todos os filmes de Hollywood antes dos anos setenta.  O filme Alamo, onde David Crockett, interpretado por John Wayne, e seus companheiros lutam até o fim contra o inimigo mostra a luta pela república.  Pode-se ver como um exagero do que os valores maçônicos são portadores e alguns, especialmente na Europa, foram capazes de descrever o filme como propagandista. Pelo contrário, podemos detectar a verdadeira sinceridade.  Não se deve esquecer que a batalha de Álamo contém sequências patrióticas para o espectador americano. Da mesma forma, o cinema desse período concentra-se na luta dos indivíduos para escapar de seu destino para realizar seu sonho.  No fundo se encontra a ideia de melhoria e realização pessoal. Em suma, nada é escrito com antecedência e os indivíduos são livres para escolher suas vidas e cumprir seu destino.  O Prisioneiro do Deserto (1956), Tombstone (1993), A Liga Extraordinária de Gentlemen (2003) e ainda Brother’s War (2009) ilustram nosso ponto.

Mas às vezes, os valores maçônicos podem ser desviados como no filme de John Huston, O homem que queria ser rei (1975), inspirado no conto de Rudyard Kipling.  Na Índia, dois ex-maçons, Daniel Dravot (Sean Connery) e Peachy Carnehan (Michael Caine), encontram-se com o compatriota  britânico o jornalista Rudyard Kipling, que conta sobre o Kafiristão, um país lendário. Eles chegam a este país depois de uma perigosa expedição.  Dravot, abusando da credulidade dos habitantes, notavelmente usando símbolos maçônicos, torna-se seu rei.  A história terminará tragicamente quando o truque é descoberto.

A Maçonaria e sua influência sobre a sétima arte também é vista através da profusão de símbolos, sinais e alusões visíveis. Compasso, esquadro, anéis ou pingentes maçônicos aparecem com frequência, mais ou menos discretamente nos filmes. Essa presença é provavelmente um reflexo do grande número de maçons nos Estados Unidos e sua integração na vida social por meio de suas atividades filantrópicas da mesma forma que os clubes Rotary, Lions ou Kiwanis. Vamos mencionar, para terminar, algumas diversões cômicas. Por exemplo, o filme Os Companheiros da Nouba que parodia os Shriners ou um episódio da série Os Simpsons, no qual Homer ingressa em uma sociedade secreta “The Stonecutters” que lhe dá acesso ao número “real” da polícia!

Na Europa: os preconceitos dominam

As difíceis condições econômicas e a instabilidade política tendem ao clima social dos anos trinta. Antes da guerra, na França, movimentos políticos de direita acusavam os maçons de constituir uma força secreta, animando e manipulando nos bastidores a vida política e trabalhando pelos interesses dos mais ricos. Dos preconceitos anti-maçônicos ao anti-semitismo, é apenas um passo. Ele será vivamente alcançado com a guerra e a ocupação da Europa pelos alemães. Os poderes sob o tacão de Hitler, incluindo o regime de Vichy, nunca deixarão de denunciar os maçons, a sua influência oculta na vida social e política e as suas supostas ligações com os judeus. Note, no entanto, que em 1930, o filme A Idade de Ouro de Luis Buñuel denuncia a igreja, a burguesia, os políticos e os maçons. Documentário propagandista e conspiracionista, o filme Forças ocultas é revelador do período, apesar de sair em sala apenas em 1943, ou seja, pouco antes da libertação. FAto notável,  Forças Ocultas é dirigido por Paul Riche, também conhecido como Jean Mamy, ex-maçom. Como muitos franceses, Paul Riche, traumatizado pela derrota de 1940, encontra os responsáveis entre os maçons mantendo ligações com parlamentares e judeus. Forças Ocultas é, portanto, um condensado de ideologia fascista: antimaçônico, antiparlamentarita, anti-semitia. Depois da guerra, filmes baseados em velhos preconceitos antimaçônicos continuam a aparecer nos cinemas europeus. Por exemplo, o filme italiano Um pequeno, pequeno burguês remonta a trágica história de um homem pronto para todos os compromissos para encontrar o assassino de seu filho. Como muitos outros, este filme não é, estritamente falando, antimaçônico, mas seu enredo é baseado em preconceitos, especialmente a suposta proximidade entre os maçons e o poder político.

Lançado em 1969, o filme Z de Costa-Gavras apresenta preconceitos positivos em relação aos maçons. Essa ficção retrata um país indefinido que na verdade se refere à Grécia da ditadura dos coronéis, na qual os Irmãos estão prontos para lutar com heroísmo e se sacrificar em prol da democracia.

Os documentários europeus e o humor
A produção europeia é também ilustrada por muitos documentários: Grand-Orient: os irmão invisíveis da República, lançado em 2005, é uma crítica às ligações entre o poder e a maçonaria. Os Maçons e o poder, produzidos em 2009, defende a mesma tese. Em paralelo existem também produções menos orientadas.  A Viagem ao País dos Maçons, de Serge Moati, lançado em 2009, é um bom exemplo dessa abordagem neutra, pelo menos com nuances.

No século XXI, os documentários do Irmão belga Tristan Bourlard lançam um novo olhar sobre a Maçonaria e suas origens, bem como seu universalismo. A Chave Escocesa (2008), um documentário em busca das origens da Maçonaria, tenta com sucesso distinguir o mito da história.  O Julgamento de Arthur Neupré (2015) dedicado ao relacionamento da Maçonaria com o fascismo em 1944, em Bruxelas. Finalmente, Terra Masonica (2017) é o mais recente documentário investigativo sobre Maçonaria e propõe um tour pelo mundo em 80 lojas. Este filme traz uma visão muito ampla da diversidade e expansão da Maçonaria no mundo 300 anos após a criação da primeira Grande Loja em Londres em 1717.

Finalmente, não nos esqueçamos do humor, cujo grande clássico para os maçons é a transmissão culta Flying Circus de Monty Python. Em vários episódios, descobrimos os apertos de mão secretos, mas de modo algum discretos, pelos quais se espera que os irmãos se cumprimentem, uma chantagem para revelar o nome de um maçom e uma terapia para deixar a Maçonaria. Esta produção televisiva é muito inglesa em sua autodepreciação.

Uma evolução antes de mais nada preocupante no cinema e nas novas mídias
Na realidade, em toda a produção cinematográfica e sem levar em consideração os documentários, pouquíssimos filmes são explicitamente dedicados a personagens, um tema ou valores relacionados à Maçonaria.  Essas produções usam aspectos bastante manipulativos, esotéricos ou conspiratórios como O Homem que Queria Ser Rei ou os dois filmes National Treasure. No entanto, séries de TV como Pierreafeu, Monty Python e os Simpsons exploram a felicidade dos rituais. Finalmente, a série policiais de TV integram de bom grado alguns episódios com os maçons, porque isso dá um pouco mais de tempero ao enredo (Colombo, inspetor Barnaby, inspetor Murdoch, inspetor Morse).

Mais recentemente, uma evolução notável aparece.  Muitos filmes navegam na conspiração e exploram as fantasias sobre maçons e Illuminati para ganhar audiência (From Hell, VITRIOL.  O maçom.) O YouTube está invadido por vídeos de círculos de conspiração, fundamentalistas cristãos ou muçulmanos ou extremistas políticos, misturando alegremente as mais exageradas teorias sobre a Maçonaria e seus símbolos, os Illuminati ou qualquer sociedade secreta supostamente em busca da dominação mundial.

Finalmente, as obediências também procuram usar esse meio para comunicar e atrair novos membros.  Como exemplo, uma obediência americana realizou um curta-metragem educacional apresentando as virtudes do maçom: Ainda melhor – Não Apenas um Homem,  Um Maçom (2017); o Grande Oriente da França colocou no YouTube um filme de animação de 8 minutos sobre as atividades em loja (2018).

Da mesma forma que os quadrinhos, a Maçonaria deveria estar mais interessada no cinema e em outros meios de comunicação audiovisual que lhe permitiriam apresentar melhor sua história e seus valores, tornando-a mais atraente para as pessoas em busca de sentido na vida.

O cineclube do GODF
Desde 1950, o Grande Oriente da França desenvolveu em suas instalações um importante cineclube  chamado Ciné debate Louis Delluc, o nome do irmão que, na virada do século 20, abriu caminho para a crítica de cinema descobrindo Forfaiture de Cécil B. Mille. Ele criou cineclubes, ensinou a linguagem cinematográfica, filmagem, enquadramento, edição e redação de roteiros.

Nos debates sobre cinema do GODF, foram exibidos muitos trabalhos importantes na presença dos diretores.

O nascimento do cinema
Em 1892, um engenheiro francês, Léon Guillaume Bouly, depositou uma patente de um dispositivo para a análise do movimento e o nomeou cinematógrafo. Mas Bouly se evaporou, porque Lumière apareceu. Uma curiosa família de químicos extravagantes mas determinados, o pai Antoine, o filho amado Auguste são maçons; em sua fábrica, eles inovam inspirados por Bouly, mas é Louis, o segundo filho que desenvolve as placas secas de brometo gelatinoso, suporte absoluto do filme.

A primeira apresentação pública na tela acontece em 28 de dezembro de 1895, no Boulevard des Capucines, soa o sino do século XIX: a era do cinema chegou. Ela começa além disso não sem frustrar seu público, porque se os Lumiere imaginavam ter dominado o tempo, o espaço e o momento, e ainda era necessário que seu “documentário congelado” ganhasse vida.

O que dizer sobre uma saída da fábrica montado sem qualquer poesia, a não ser dissertar sobre o binômio “imagem-mentira”? É bom ser lúcido e rigoroso, não nos esqueçamos que a empresa empregadora Lumière enriqueceu-se, enquanto na outra ponta, Emile Raynaud, o pai do desenho animado apresentado em seu teatro óptico (1892-1900) morreria indigente em um hospital parisiense. Da mesma forma, Georges Méliès, inspirado e genial, em seu estúdio de Montreuil, acabou como vendedor de brinquedos em uma loja da estação de Montparnasse. Este poeta visionário, admirado por Edison, adorado por Apollinaire, trouxe significado à imagem.  Devemos acrescentar que ele deve a Martin Scorsese ter sido homenageado em um trabalho de 2012, Hugo Cabret.

Desde 1860, um americano investe na imaginação e a transforma – Thomas Edison, detentor de mil patentes, retoma a criação do cinema, da lâmpada elétrica ao filme de celuloide passando pelo cinetoscópio, o ancestral da câmera.  Mas o sábio também é, apesar de alguns fracassos, um financista e, de 1902 a 1907, participou do lançamento das primeiras produtoras de filmes americanos que debutarão em Hollywood. Jean-Louis Coy, Revista Maçonaria No. 16



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1 Comentários

  1. Excelente trabalho irmão. Cita do menções à Ordem, sugiro "Homens de Preto 3" ou MIB3 como preferir. Me deparei com uma simbologia muito sutil em determinado momento do filme. Não vou cita-lo pra não desvendar simbologia a profanos ou recém iniciados.

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