Sobre
a Carbonária, o único escritor, no Brasil, que se dedicou realmente em trazer
algum esclarecimento, foi o Irmão Adelino de Figueiredo Lima, um dos primeiros
contestadores de algumas das mazelas que debilitaram a nossa Ordem e que ainda
debilitam. Todavia, este trabalho não comporta esse tipo de assunto por isso é
que vamos transcrever apenas uma pequena introdução que ele fez da Carbonária:
"Nenhuma
Sociedade Secreta fascinou tanto as multidões sequiosas de sua liberdade, ou da
independência política conquistada à custa de lágrimas e sangue, quanto a
Maçonaria Florestal, mais conhecida como "Carbonária", por ter sido
fundada pelos carvoeiros da Hannover, como associação de defesa e de ação
contra os opressores e assaltantes de sua classe.
Constituída
no último Quartel do Séc. XV, ela só veio a entrar na História, como
organização de caráter político, após a Grande Revolução Francesa.
Na
Itália, ela adquiriu fama de violenta e sanguinária, e introduzida na França
por ordem de Napoleão, não tardou em converter-se na mais poderosa força
oposicionista ao expansionismo do grande corso, lutando contra ele na França,
na Áustria, na Espanha e em Portugal.
O
nome de "Maçonaria Florestal", veio-lhe depois que irrompeu, na
Itália e na França. "Maçonaria", porque os Maçons a propagavam e a
protegiam, "Florestal", porque as Iniciações dos seus Membros,
lembravam as dos antigos Carvoeiros de Hannover, realizadas nas florestas mais
densas, a cobertos das vistas estranhas.
Os
Carbonários, antes de serem investidos nos Segredos da Ordem, passavam por
duras provas e prestavam os mais terríveis juramentos, como este, que eram
assinados com próprio sangue:
"Juro
perante esta assembléia de homens livres, que cumprirei as ordens que receber,
sem as discutir e sem hesitar, oferecendo o meu sangue em holocausto, à
libertação da Pátria, à destruição do inimigo e à felicidade do Povo. Se faltar
a este juramento, ou trair os desígnios da Poderosa Maçonaria Florestal, que a
língua me seja arrancada e o meu corpo submetido ao fogo lento por não ter
sabido honrar a Pátria que foi meu berço."
Só
depois deste juramento é que o Candidato recebia as insígnias de "Bom
Primo", — (as insígnias de Bom Primo consistiam de um balandrau preto e
Capuz, tendo bordado, em branco, no peito, um punhal (o punhal de São
Constantino), com o cabo no formato cruciforme entrelaçado a uma cruz cristã.)
O punhal de São Constantino não constava somente de um desenho bordado no Peito
do Balandrau Preto, era também uma arma branca, que todos os Carbonários usavam
— também em suas execuções — como símbolo da Ordem a qual pertenciam.
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O
Balandrau Preto, dos líderes, ao invés do Punhal e da Cruz entrelaçados —
possuía bordado no peito, em dourado, um sol radiante.
O
brado de guerra dos Carbonários consistia em, cada um, levantar o seu punhal
bem alto. Normalmente as reuniões dos tribunais carbonários eram realizadas, a
exemplo dos carvoeiros de Hannover, no passado, em plena floresta, bem distante
dos olhares curiosos e indevidos.
Seus
julgamentos eram implacáveis e seus réus, se condenados, eram executados com a
máxima eficiência. O Carbonário era, as vezes, juiz e carrasco ao mesmo
tempo. Seus afiliados (jamais podiam trair a Ordem. Os que traíram, sempre
foram exemplarmente executados) se tornavam Carbonário ou executor das ordens
de "Alta Venda". Em cada país a Organização da "Maçonaria
Florestal" obedecia ao esquema italiano:
"Alta
Venda", corpo deliberativo superior, composto de um Delegado da cada
"Barraca", composta por sua vez por um Delegado de cada
"Cabana"; e as "Cabanas" eram formadas por um Delegado de
cada "Choça". Acima da "Alta Venda" estava porém, a
"Jovem Itália", composta por um triunvirato que nas lutas pela
Unificação e pela queda do Poder Temporal dos Papas, era constituído por
Cavour, Mazzini e Garibaldi.
A
Carbonária Italiana, a princípio, foi protegida pelo Carbonário Lucien Charles
Napoleão Murat — General de Napoleão Bonaparte — e Princípe de Monte Corvo,
filho do Marechal Murat, nascido em Milão, em 1803. Ele abandonou a Itália em
1815, com a derrocada de Napoleão em Waterloo, em 18.07.1815, tendo sido
capturado na Espanha. Após sua libertação, seguiu para os Estados Unidos, em
1825. Ali se casou, tendo retornado a Paris em 1848.
Mais
tarde, Murat foi eleito Grão Mestre do Grande Oriente, conseguindo um progresso
muito grande no erguimento da Obediência, com a fundação de muitas novas Lojas.
Um
dos elementos que se deve destacar na Carbonária Italiana — não pelos seus atos
patrióticos, mas sim pela sua traição à Carbonária — é o Conde Peregrino Rossi.
Rossi teve duas atitudes distintas: na mocidade, foi um dos mais ativistas e
propagandistas dos ideais da Carbonária, merecendo o respeito de todos os Bons
Primos. Todavia, de um momento para outro, bandeou-se para as hostes inimigas.
Rossi
aliou-se ao Papa Gregório XVI com a finalidade de conseguir do Papa,
condenações às ações dos Jesuítas. Nesse ínterim, morre Gregório XVI e sobe ao
Trono de São Pedro o Papa Pio IX, ao qual Rossi se afiliou de corpo e alma.
Rossi, que fora até Roma para combater o jesuitismo, volta um fiel defensor dos
Irmãos de Inácio de Loyola.
É
proscrito da Carbonária em 1820 e se torna um novo Saulo, convertendo-se aos
ideais do Papa.
—
Era o novo Judas —, gritavam em todas as "Barracas", de punhal em
riste, os Bons Primos, seus antigos companheiros.
Conhecedor
que era dos métodos de seus antigos companheiros, Rossi teve muita facilidade
de nominar seus líderes e encher as prisões da Cidade Eterna, dando um tremendo
golpe no movimento revolucionário.
Rossi
cada vez mais se dedicava a uma ação repressiva, sem pensar que — desde a mais
humilde "Choça" à mais pujante "Barraca", e com Giuseppe
Mazzini tendo o controle de todas as "Altas Vendas" — os punhais de
São Constantino eram levantados e descreviam no ar o ângulo reto das decisões
fatais. A sentença estava lavrada, terrível e implacável.
Havia
sido marcada uma reunião para o dia 15 de novembro, a 1 hora da tarde, com o
Ministro Conde Peregrino Rossi.
Dissera
Rossi no dia anterior: "— Se me deixarem falar, se me derem tempo para
pronunciar o meu discurso, não só a Itália estará salva, como ficará
definitivamente morta a demagogia da Península". A demagogia da
península era o movimento Carbonário.
"La
causa del Papa es la causa del Dio". E o Conde Peregrino Rossi desceu as
escadarias e entrou na carruagem que o levaria ao Parlamento.
Chegando
à praça, a carruagem atravessou lentamente a multidão e entrou pela porta do
Palácio e foi parar em frente ao vestíbulo, onde Peregrino Rossi foi saudado
por assobios e gritos enraivecidos:
—
Abaixo o traidor !
—
Morte ao vendilhão da Pátria !
Só
então Rossi se apercebeu que nem toda a consciência nacional estava encarcerada
na Civiltá Véchia.
Esboçou
um sorriso contrafeito para a multidão e quando se dispunha a continuar a
marcha, recebeu um golpe na carótida, especialidade dos Bons Primos, que o fez
tombar agonizante.
No
bolso interno da sobrecasaca, ao ser recolhido o cadáver, foi encontrada a
sentença de morte: "Juraste lutar pela unificação da Itália e traíste o
juramento ! Lembrando: 'Juro que jamais abandonarei as armas ou desertarei do
Movimento Patriótico, enquanto a Itália não for livre e entregue a um governo
do Povo, para o Povo. Se eu faltar a esse juramento, prestado de minha livre e
espontânea vontade, que o pescoço me seja cortado e o meu nome desonrado e
apregoado como o mais vil traidor à Pátria e aos Bons Primos da Carbonária
Italiana'. Com coisas sérias não se brinca !"
Como
vimos, a Carbonária estava a léguas de distância da Maçonaria, mas apesar
disso, sempre foi confundida com a Maçonaria, até por Maçons bisonhos que acreditam
que no passado a Maçonaria executava Irmãos e profanos que não rezassem por sua
cartilha. De vez em quando, ouvimos um Irmão dizer que a Maçonaria precisa
voltar a ser o que era no passado, e executar os maus elementos da sociedade.
A
Maçonaria em tempo algum executou os maus elementos da sociedade. Quem, às
vezes fez isso, foi a Carbonária, a Santa Vehme, a Maçonaria não. A Maçonaria
sempre foi pacífica, respeitadora da lei e ordem. Só usando sua estrutura
fechada para conspirar contra os maus regimes políticos e algumas instituições
nocivas, mas sempre ordeira e pacificamente. Seus membros, sim, às vezes,
independentemente de suas Lojas, se filiavam a movimentos ou grupos vingadores.
FONTE: GLESP
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