Por
Vitor Manuel Adrião
Wilmshurst,
um dos fundadores da Maçonaria Especulativa no século XVIII, define-a da
maneira seguinte: “É um sistema sacramental que, como todo o sacramento, tem um
aspecto externo e visível, consistindo no seu cerimonial, doutrinas e símbolos,
e outro aspecto interno, mental e espiritual oculto sob as cerimônias,
doutrinas e símbolos, só acessível ao maçom que haja aprendido a usar a sua imaginação espiritual e seja capaz de apreciar a realidade velada pelo símbolo
externo”.
Il
Frosini afirma que a original Maçonaria Operativa já existia em Veneza no
séculos XV-XVI, tendo em 1515 se transferido para Santo Apolinário graças à
intervenção de Pietro Lombardo que adquiriu uma parcela do Campanile para
construir a sua própria sede. Tal construção, na Rua do Campanile, apresenta
ainda hoje na sua fachada o alto-relevo com os “Quatro Santos Coroados” e a
inscrição: “MDCLII SCOLA DI TAGLIAPIERA”.
Essa
Escola de Pedreiros-Livres esteve ativa em Veneza até 1686, data em que a
Maçonaria foi interdita nesta cidade, e só após 1729, quando o Grão-Mestre da
Loja de Londres visitou Veneza, hospedando-se numa casa na Madonna dell´Orto, é
que a Maçonaria voltou a tomar força mas já sob a nova forma de Especulativa.
Então, é fundada por Marconis de Negre, filho de um oficial da armada francesa
no Egito, a Sociedade dos Sábios da Luz, que foi o ponto de partida para a
expansão da Maçonaria veneziana no século XVIII.
Os
maçons venezianos quiseram inculcar reforma políticas na República de Veneza
para que fosse um modelo social a seguir por todas as sociedades da Europa, e
da cidade de Veneza quiseram-na fazer um modelo de perfeição moral e social,
como se constata, por exemplo, no poema heróico do filósofo e maçom Giulio
Strozzi, La Venetia Edificata. Para isso serviram-se da literatura e das
belas-artes para gerar reformas profundas no tecido social e urbano veneziano.
Ao
contrário desse pensamento iluminista, deu-se o anacronismo da Maçonaria
utilizar-se da Carbonária, espécie de seu “braço armado” com organização
interna semelhante à maçônica que aparecera em Itália no início do século XIX
pela mão dum tal general Pepe, a qual distinguiu-se sobretudo pelas suas acções
armadas que espalharam o terror na República veneziana e em toda a península
itálica. Os carbonários reuniam-se secretamente em cabanas de carvoeiros,
derivando daí o seu nome. Republicanos radicais, muitas vezes assassinos de
reis e rainhas, aos carbonários também se deve a invenção do esparguete à
carbonara.
Por
essa razão, durante a República de Veneza a Maçonaria foi sempre estreitamente
vigiada pelas autoridades. Ainda assim, em 1778 existiam nela cinco Lojas
maçónicas (duas em Veneza, uma em Bréscia, uma em Vicenza e uma em Pádua). Mas
igualmente houve maçons que se distanciaram das agitações políticas do seu
tempo e se dedicaram exclusivamente à prática da sua ideologia espiritualista,
esta que também foi vigiada de perto pela Igreja que via na Maçonaria uma
adversária em matéria de conhecimentos e tradição.
Segundo
o Inventário de 7 de Maio de 1785, noticiado por Rossi Osmida em 1988, a
primeira e principal Loja de Veneza chamava-se Fedeltà e fora fundada em 1780.
Estava instalada num palácio junto ao Rio Marin e caracterizava-se pelos seus
estudos de Alquimia e Hermetismo e a prática do Rito Escocês Retificado; depois
adaptou o Rito de Misraim, fundado em Veneza em 1788 por Cagliostro. Fundaram
esta Loja Domenico Gasperoni e o veneziano Michele Sessa, apelidado Ecques
Michael a Leone, ou seja, “Michele veneziano”, que passou a Venerável ou
dirigente supremo dessa Loja após ter obtido autorização da Grande Loja de
Verona, em 1778.
A
Loja Fedeltà possivelmente esteve ativa até perto do final do século XIX.
Sabe-se que por ela passaram nomes distintos da Maçonaria, como Giuliano de
Lorenzo, Francesco Milizia e o seu discípulo Tommaso Temanza (1705-1789), arquiteto
da igreja de Santa Maria Madalena nesta cidade de Veneza.
Igreja de Santa Maria Madalena, Veneza |
A
filiação maçônica de Tommaso Temanza ficou claramente marcada nessa igreja da
Madalena, em vários símbolos que aí se podem ver, sendo de realçar que Maria
Madalena, para os primitivos monge-construtores cristãos, era simbólica da Arte
Operativa por ter sido ela, segundo os Evangelhos, quem primeiro viu o Senhor
ressuscitado e deu início à difusão da sua Palavra de edificação da Igreja
Universal. A tradição simbólica associa ainda o nome de Madalena à deusa Lusina
celta, também ela Orago dos construtores-livres, e à fabulosa Melusina, cuja
lenda nobiliárquica dá-a como origem dos Lusignan, sendo ao mesmo tempo
figuração da Iniciação Secreta, isto é, detentora dos conhecimentos esotéricos
vedados à Humanidade comum.
(*) Vítor Manuel Adrião, renomado escritor esotérico português, é consultor de investigação filosófica e histórica, formado em História e Filosofia pela Faculdade de Letras de Lisboa, tendo feito especialização na área medieval pela Universidade de Coimbra. Presidente-Fundador da Comunidade Teúrgica Portuguesa e Director da Revista de Estudos Teúrgicos Pax, Adrião é profundo conhecedor da História Medieval do Sagrado, sendo conferencista de diversos temas relacionados ao esoterismo, às religiões oficiais, aos mitos e tradições portuguesas, às Ordens de Kurat (em Sintra) e do Santo Graal, das quais também faz parte.
Fonte: Lusophia - https://lusophia.wordpress.com/
2 Comentários
Não entendi por que o autor, apresentando imagens que apresentou, possa definir que a maçonaria operativa "original" nasceu em Veneza. Ou não sabe de números romanos, ou leu-os errados! A imagem posta num frontispício de um prédio, indica a existência de uma Escola de Talhadores de Pedras, que existiu desde 1752 (MDCCLII). Neste período de 1700, já existia a Maçonaria que denominamos Especulativa, fundada em Londres em 1717. A Grande Loja Unida da Inglaterra. "Maçonaria" havidas como operativa, ou pseudas maçonarias existem desde o momento das construções das grandes catedrais, castelos e fortes, em pedras talhadas na Europa. Eram associações mutuais de trabalhadores denominadas Guildas. Franca e honestamente não vejo necessidades de se inventar mais histórias á pseudos passados para a Maçonaria fundada em 1717.
ResponderExcluirPenso que a maçonaria especulativa existe desde tempos imemoriais, talvez há milênios. Apenas foi sistematizada pelos Ingleses num sistema mais organizado de Lojas no século XVIII... segundo algumas tradições, a maçonaria seria herdeira de outras ordens que remontariam às civilizações da antiguidade, como Caldeia, Egito e Grécia....
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