“Nenhuma
Sociedade Secreta fascinou tanto as multidões sequiosas de sua liberdade, ou da
independência política conquistada à custa de lágrimas e sangue, quanto a
Maçonaria Florestal, mais conhecida como “Carbonária”, por ter sido fundada
pelos carvoeiros da Hannover, como associação de defesa e de ação contra os
opressores e assaltantes de sua classe. Constituída no último Quartel do Séc.
XV, ela só veio a entrar na História, como organização de caráter político,
após a Grande Revolução Francesa.
Na
Itália, ela adquiriu fama de violenta e sanguinária, e introduzida na França
por ordem de Napoleão, não tardou em converter-se na mais poderosa força
oposicionista ao expansionismo do grande corso, lutando contra ele na França,
na Áustria, na Espanha e em Portugal.
“Maçonaria”,
porque os Maçons a propagavam e a protegiam, “Florestal”, porque as Iniciações
dos seus Membros, lembravam as dos antigos Carvoeiros de Hannover, realizadas
nas florestas mais densas, a cobertos das vistas estranhas.
Os
Carbonários, antes de serem investidos nos Segredos da Ordem, passavam por
duras provas e prestavam os mais terríveis juramentos, como este, que eram
assinados com próprio sangue:
“Juro perante esta assembleia de homens
livres, que cumprirei as ordens que receber, sem as discutir e sem hesitar,
oferecendo o meu sangue em holocausto, à libertação da Pátria, à destruição do
inimigo e à felicidade do Povo. Se faltar a este juramento, ou trair os
desígnios da Poderosa Maçonaria Florestal, que a língua me seja arrancada e o
meu corpo submetido ao fogo lento por não ter sabido honrar a Pátria que foi
meu berço.” Só depois deste juramento é que o Candidato recebia as
insígnias de “Bom Primo”, (as insígnias de Bom Primo consistiam de um balandrau
preto e Capuz, tendo bordado, em branco, no peito, um punhal (o punhal de São
Constantino), com o cabo no formato cruciforme entrelaçado a uma cruz cristã.)
O punhal de São Constantino não constava somente de um desenho bordado no Peito
do Balandrau Preto, era também uma arma branca, que todos os Carbonários
usavam, também em suas execuções, como símbolo da Ordem a qual pertenciam.
O
Balandrau Preto, dos líderes, ao invés do Punhal e da Cruz entrelaçados possuía
bordado no peito, em dourado, um sol radiante.
O
brado de guerra dos Carbonários consistia em, cada um, levantar o seu punhal
bem alto.
Normalmente
as reuniões dos tribunais carbonários eram realizadas, a exemplo dos carvoeiros
de Hannover, no passado, em plena floresta, bem distante dos olhares curiosos e
indevidos.
Seus
julgamentos eram implacáveis e seus réus, se condenados, eram executados com a
máxima eficiência. O Carbonário era, às vezes, juiz e carrasco ao mesmo tempo.
Seus afiliados (jamais podiam trair a Ordem. Os que traíram, sempre foram
exemplarmente executados) se tornavam Carbonário ou executor das ordens de
“Alta Venda”. Em cada país a Organização da “Maçonaria Florestal” obedecia ao
esquema italiano: “Alta Venda”, corpo deliberativo superior, composto de um
Delegado da cada “Barraca”, composta por sua vez por um Delegado de cada
“Cabana”; e as “Cabanas” eram formadas por um Delegado de cada “Choça”. Acima
da “Alta Venda” estava, porém, a “Jovem Itália”, composta por um triunvirato que
nas lutas pela Unificação e pela queda do Poder Temporal dos Papas, era
constituído por Cavour, Mazzini e Garibaldi.
A
Carbonária Italiana, a princípio, foi protegida pelo Carbonário Lucien Charles
Napoleão Murat, General de Napoleão Bonaparte, e Princípe de Monte Corvo, filho
do Marechal Murat, nascido em Milão, em 1803. Ele abandonou a Itália em 1815,
com a derrocada de Napoleão em Waterloo, em 18 de julho de 1815, tendo sido
capturado na Espanha. Após sua libertação, seguiu para os Estados Unidos, em
1825. Ali se casou, tendo retornado a Paris em 1848.
Mais
tarde, Murat foi eleito Grão Mestre do Grande Oriente, conseguindo um progresso
muito grande no erguimento da Obediência, com a fundação de muitas novas Lojas.
Um
dos elementos que se deve destacar na Carbonária Italiana, não pelos seus atos
patrióticos, mas sim pela sua traição à Carbonária, é o Conde Peregrino Rossi.
Rossi teve duas atitudes distintas: na mocidade, foi um dos mais ativistas e
propagandistas dos ideais da Carbonária, merecendo o respeito de todos os Bons
Primos. Todavia, de um momento para outro, bandeou-se para as hostes inimigas.
Rossi
aliou-se ao Papa Gregório XVI com a finalidade de conseguir do Papa,
condenações às ações dos Jesuítas. Nesse ínterim, morre Gregório XVI e sobe ao
Trono de São Pedro o Papa Pio IX, ao qual Rossi se afiliou de corpo e alma.
Rossi, que fora até Roma para combater o jesuitismo, volta um fiel defensor dos
Irmãos de Inácio de Loyola.
É
proscrito da Carbonária em 1820 e se torna um novo Saulo, convertendo-se aos
ideais do Papa. Peregrino Rossi era o novo Judas, gritavam em todas as
“Barracas”, de punhal em riste, os Bons Primos, seus antigos companheiros.
Conhecedor
que era dos métodos de seus antigos companheiros, Rossi teve muita facilidade
de nominar seus líderes e encher as prisões da Cidade Eterna, dando um tremendo
golpe no movimento revolucionário.
Rossi
cada vez mais se dedicava a uma ação repressiva, sem pensar que, desde a mais
humilde “Choça” à mais pujante “Barraca”, e com Giuseppe Mazzini tendo o
controle de todas as “Altas Vendas”, os punhais de São Constantino eram
levantados e descreviam no ar o ângulo reto das decisões fatais. A sentença estava
lavrada, terrível e implacável.
Havia
sido marcada uma reunião para o dia 15 de novembro, à 1 hora da tarde, com o
Ministro Conde Peregrino Rossi. Dissera Rossi no dia anterior: ” Se me deixarem
falar, se me derem tempo para pronunciar o meu discurso, não só a Itália estará
salva, como ficará definitivamente morta a demagogia da Península”. A demagogia
da península era o movimento Carbonário.
“La causa del Papa es la causa del Dio”.
E o Conde Peregrino Rossi desceu as escadarias e entrou na carruagem que o
levaria ao Parlamento.
Chegando
à praça, a carruagem atravessou lentamente a multidão e entrou pela porta do
Palácio e foi parar em frente ao vestíbulo, onde Peregrino Rossi foi saudado
por assobios e gritos enraivecidos:
Abaixo o traidor ! Morte ao vendilhão da Pátria ! Só então Rossi notou
que nem toda a consciência nacional estava encarcerada na Civilitá Véchia.
Esboçou
um sorriso contrafeito para a multidão e quando se dispunha a continuar a
marcha, recebeu um golpe na carótida, especialidade dos Bons Primos, que o fez
tombar agonizante.
No
bolso interno da sobrecasaca, ao ser recolhido o cadáver, foi encontrada a
sentença de morte: “Juraste lutar pela unificação da Itália e traíste o
juramento ! Lembrando: ‘Juro que jamais abandonarei as armas ou desertarei do
Movimento Patriótico, enquanto a Itália não for livre e entregue a um governo
do Povo, para o Povo. Se eu faltar a esse juramento, prestado de minha livre e
espontânea vontade, que o pescoço me seja cortado e o meu nome desonrado e apregoado
como o mais vil traidor à Pátria e aos Bons Primos da Carbonária Italiana’. Com
coisas sérias não se brinca !”
A
transcrição acima é de autoria do maçom Adelino de Figueiredo Lima, um dos
raros brasileiros a escrever sobre a Carbonária. O trecho acima nos mostra
que a Carbonária estava muito distante
da Maçonaria (que nunca usou tais métodos), mesmo assim a Carbonária sempre foi
confundida com a Maçonaria, e alguns Maçons ainda acreditam que, no passado, a
Maçonaria executava Irmãos e profanos que não cumprissem suas regras.
Jamais
a Maçonaria, mesmo no passado remoto, matou ou mandou matar os maus elementos
da sociedade. Quem fez isso, foi a Santa Vehme e a Carbonária (chamada de
Maçonaria Florestal, talvez aí resida o ponto de confusão entre as duas
instituições). A Maçonaria verdadeira sempre foi pacífica, respeitadora da lei
e da ordem. Só usando sua estrutura fechada para conspirar contra os maus
regimes políticos e algumas instituições nocivas, mas sempre ordeira e
pacificamente. É verdade que conseguiu
derrubar tiranos do poder e colaborar com a independência de muitos povos, para
isso usando sua organização exemplar e suas influências sociais. Em muitas
ocasiões seus integrantes, independentemente de suas Lojas, se filiavam a
movimentos ou grupos ativistas e vingadores, embora a Maçonaria, como
instituição nunca tenha apoiado tais comportamentos. É inegável que, em certar
ocasiões, a Carbonária recebeu apoio da maçonaria, entretanto nunca foram uma
mesma instituição, seus propósitos e seus objetivos raramente foram os mesmos.
Por
Irmão Honório Sampaio Menezes,33º do REEA, Loja Baden-Powell 185, GLMERGS,
Brasil.
2 Comentários
Bom trabalho, boa peça de arquitetura.
ResponderExcluirBah, baita texto, muito instrutivo. Parabéns! TFA
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