Por Rui Bandeira
Fraternidade é um
espaço, uma cultura, uma postura, um sentimento, que junta um conjunto de
pessoas numa teia de relações similares às que se criam ente irmãos de sangue.
Tal como os irmãos no seio de uma família, brinca-se, exerce-se o mútuo auxílio,
colabora-se, ajuda-se o outro a crescer e cresce-se com a ajuda do outro. Mas
também tal como os irmãos no seio de uma família, discute-se, amua-se, têm-se
zangas e reconciliações, disputas e alianças.
Fraternidade não é
um oásis de sol e delícias. Fraternidade é a vida vivida em conjunto, com união
mas também com busca de cada um do crescimento da sua individualidade no seio
do grupo.
Fraternidade
implica que quando um dos nossos é injustamente acusado nos levantemos, com
indignação, em defesa da honra de quem sofreu o ataque da injustiça. Mas também
implica que, quando um dos nossos erra e acusa injustamente alguém, seja
severamente criticado. Porque, afinal, o nosso objetivo comum é que todos e
cada um de nós se aperfeiçoe e isso impõe que se mostre o erro quando existe,
se exija a sua reparação, se necessário se aplique a devida sanção, se aponte a
senda correta, em vez do carreiro da injustiça.
Fraternidade é
saber-se que nenhum de nós é perfeito, mas efetivamente prosseguir o
compromisso, connosco e para com os demais, de cada um desbastar sua pedra e
alisar suas imperfeições. E, quando se erra, reparar o mal, não persistir no
erro e tirar a lição para agir e ser melhor no futuro.
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Particularmente
exigente é a situação em que um dos nossos é injustamente visado por um dos
nossos, quando o erro parte de dentro de nós e atinge um de nós. Aí, a
Fraternidade não exige - pelo contrário! - que nos abstenhamos de intervir,
porque afinal o problema é dentro de casa. Aí há que intervir com particular
acuidade, pois o injustiçado sente exponencialmente a injustiça quando vinda de
um dos seus e quem erra tem de compreender que o seu erro tem de cessar
prontamente e de vez, pois põe em causa o Irmão, o conjunto de Irmãos e, assim,
ele próprio, ao colocar em crise a confiança subjacente ao relacionamento
fraterno.
Em grupos coesos e
fraternos vemos frequentemente ocorrer conflitualidade, A Fraternidade não
impede essa existência. Mas os grupos coesos e fraternos aprendem e sabem como
gerir os conflitos e torná-los fatores de melhoria e de avanço, individual e
coletivo. O que importa é que, acima de tudo, exista respeito, consideração e
disposição para a cooperação.
Fraternidade gera
muitas vezes amizade. Mas não necessariamente. Podem-se estabelecer relações
fraternas, coesas, gratificantes, eficazes para a melhoria mútua com pessoas
com quem não se estabelecem particulares relações de amizade. Porventura os
temperamentos serão diferentes, mas os objetivos são comuns e o auxílio mútuo é
reconhecido como o melhor caminho.
Mas também a
amizade, por si só, não gera a Fraternidade. Porque a amizade pode ser mansa e
plácida e agradável, mas não ser fator de crescimento, de melhoria.
Fraternidade implica desafio, emulação, auxílio competitivo mesclado com
respeito e confiança mútuos, que cria as condições para que todos avancem.
Mas quando a
Fraternidade gera a amizade e ambas são vividas e praticadas em prol do
crescimento dos amigos fraternos, então a eficácia da Fraternidade é
exponencial.
Lembrei-me disso ao
reler o texto, já antigo de mais de seis anos aqui no blogue, Os dois
marretas. Ilustra como dois desconhecidos se encontram, por obra
do acaso ou pelos desígnios do Grande Arquiteto do Universo, inseridos numa
Fraternidade. Como são diferentes um do outro. Como aprenderam a
complementar-se nas suas diferenças. Como souberam potenciar o apoio mútuo no
crescimento de ambos. Como nesse processo nasceu, cresceu e se mantém uma
singular amizade, não decorrente das semelhanças, mas regada pelo inteligente
aproveitamento das diferenças e sempre adubada pela indestrutível confiança
mútua.
E é assim, pela
conjunção da Fraternidade conjugada com a amizade, ambas habilmente
aproveitando o potencial das diferenças, que continua hoje a ser verdade o que
já era verdade há anos atrás (e cito daquele texto): quando (o acordo) chega ou
quando nunca chegou a haver desacordo, todos sabem que é melhor sair da frente,
que estes dois, quando decidem puxar para o mesmo lado, são ossos duros de
roer...
E isso também é
Fraternidade!
Fonte: A Partir
Pedra
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