HUZZÉ, A ORIGEM DA ACLAMAÇÃO ESCOCESA


Na maçonaria brasileira, os irmãos praticantes do REAA (Rito Escocês Antigo e Aceito) estão bem familiarizados com a tripla aclamação Huzzé, utilizada na abertura e no fechamento dos trabalhos, mas a sua origem é um pouco duvidosa devido a confusão de teorias criadas por escritores que talvez não tivessem o acesso a tanta informação quanto temos atualmente, e com a facilidade que a internet nos proporciona.

Cito abaixo algumas teorias bem conhecidas sobre a origem da aclamação:

– Huzzé é derivada de uma palavra hebraica que significaria uma espécie de “acácia”, como símbolo de imortalidade;

– Palavra formada pela raiz O’z e sufixo Zé, significando “É minha força” uma alusão ao GADU;

– Origem espanhola – alguns dizem que Cavaleiros Templários que fugiram da França frente às perseguições do Rei Filipe e do Papa Clemente V e se refugiaram no sul da Espanha, uniram-se a população local para combaterem durante a guerra civil que assolava a região e a cada vitória eles gritavam a palavra Huzzé em celebração;

– Aclamação realizada para expulsar o “ar impuro”, mandando embora todo o negativismo que carregamos no dia-a-dia profano;

– Huzzé seria uma espécie de Hurra, como a aclamação Hip, Hip, Hurra;

Diante desta confusão, busco na história a origem e inserção desta prática na maçonaria.

Um pouco de história
Tudo indica que a aclamação Huzzé, deriva da palavra Huzza dos ingleses, onde a pronúncia com o tempo, criou a modificação na escrita.

O livro Essential Militaria de Nicholas Hobbes nos informa que nos séculos XVII e XVIII, Huzza era um cumprimento ou saudação usado pelos marinheiros, para homenagear quem embarcava ou desembarcava. Menciona também que a expressão era um grito repetido em uníssono, sincronizadamente, quando os marujos atuavam em conjunto para puxar os cabos das velas ou as amarras das embarcações.

Há relatos de que nos séculos XVIII e XIX, três Huzzas eram dados pela infantaria britânica antes dos disparos, como meio de ganhar moral e de intimidar o inimigo. Há quem diga que eram dois huzzas curtos seguidos de um terceiro, mais longo, dado durante a carga final.

Foi dessa forma, acreditamos, que o brado utilizado no REAA deve ter chegado aos marinheiros ingleses e depois, pelo fato da Inglaterra ser um país onde as atividades navais ocupavam grande destaque, passado ao resto da sociedade não só como exclamação de alegria e aprovação, mas também como designativo de união e atitude solidária. Disso, talvez, advenha sua adoção pela maçonaria.

Mas quando esta aclamação passou a ser utilizado pelos maçons?

William Preston, em seu livro Illustrations of Masonry, descreve com detalhes o evento ocorrido em 1753 na Escócia, no evento de lançamento da pedra fundamental do conjunto de edifícios chamados “The New Exchange of Edinburgh”, onde foi realizada uma procissão de 672 irmãos, que foi iniciada em frente a famosa Mary´s Chapel, em caminhada até o local onde seria lançada a pedra fundamental.

A procissão foi recebida por mais de 150 militares juntamente com uma companhia de granadeiros, em duas linhas, sob as armas, que escoltaram a procissão. Este fato foi de tão importância para os maçons, que o Grão-Mestre da Escócia, Lorde Carysfort, descreveu a honra de estar presente a tal acontecimento e ao realizar a cerimônia de lançamento da pedra fundamental, deu três pancadas na pedra com o Maço, seguido de três huzzas, provavelmente em homenagem aos militares ali presentes tendo visto a forte relação dos militares com a maçonaria.

Após alguns procedimentos do evento, o Grão-Mestre proferiu a frase “Que a mão generosa do céu abasteça esta cidade com abundância de milho, vinho, óleo e todas as outras conveniências da vida! Huzza, Huzza, Huzza!!!”.

Outro livro descreve a utilização da aclamação na Escócia ainda no século XVIII, geralmente em lançamentos de pedras fundamentais. A obra escrita William Alexander Laurie em 1804, sob o nome “The history of free masonry and the Grand Lodge of Scotland” cita que a prática militar de aclamar três Huzzas juntamente com o tocar de trombetas, diversas vezes foi realizada para recepcionar os maçons nos eventos.

O escritor inglês John Dunton, no livro “Cartas da nova Inglaterra”, registra o costume militar de se saudar autoridades com gritos de Huzza, muito comum entre os militares ingleses e escoceses. Huzza era o grito de guerra usado pelas tropas da marinha inglesa, bem como a do corpo de granadeiros.

 Em 1778, para celebrar a aliança realizada com a França, o general George Washington diz ao seu exército: “Huzza, Viva o rei da França, Huzza, Vivam os amigos das potências europeias, Huzza, Viva o Estados Unidos da América”.

E finalmente, o exército Inglês faz uso dessa expressão (Huzza) em uma canção de marcha dirigida contra os franceses:

“And, Monsieurs, you’ll find us as good as our words:

Beat drums, trumpets sound, and Huzza for our King!

Then welcome Bellisle, with what troops thou canst bring!

Huzza! for Old England, whose strong-pointed lance

Shall humble the pride and the glory of France.”

Observando a aclamação nos rituais

Embora a aclamação Vivat, Vivat, Vivat, já apareça em 1737, com a divulgação de “La réception d’un Frey-Maçon” e no rito adohiramita com o “Recueil Precieux de la Maçonnerie Adonhiramite”, o triplo Huzzé e suas variantes não aparecem nos documentos do século XVIII.

Nas primeiras divulgações como o Maçonaria Dissecada (1730) e o Três Batidas Distintas (1760), apesar de aparecerem os três golpes de malhete na abertura dos trabalhos, não faz referências a aclamação.

Somente em 1804, no “Guia dos Maçons Escoceses”, também chamado de “Livro dos três graus simbólicos do rito antigo e aceito”, que a tripla aclamação surge na abertura e fechamento dos trabalhos da loja, neste momento escrito como “Houzze”.

Depois, em 1813, no livro “Tuileur de l’Écossisme” de Delaulnaye, novamente é registrada a utilização da aclamação escocesa (Houzze) na abertura da loja.

Conclusão
Estou convencido que a tripla aclamação escocesa foi inserida na maçonaria por influência dos militares e dos eventos ocorridos no século XVIII e descritos acima, era muito comum o alto escalão militar estar composto por maçons que ocupavam também cargos de importância na administração da maçonaria. O Huzzé foi usado inicialmente como uma exclamação de alegria e comemoração, simples assim, sem invenções e significados mirabolantes.

Bibliografia:
Illustration of Masonry – William Preston
The history of free masonry and the Grand Lodge of Scotland – William Alexander Laurie
Essential Militaria – Nicholas Hobbes
Tuileur de l’Écossisme – Delaulnaye

Por Ir.'.  Luciano Rodrigues





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